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    A atriz Malu Rocha, nos anos 70: até que ponto ela foi contaminada pela loucura da mãe, que foi contaminada pela do pai abusador? E Malu não terá transmitido agora tudo isso para sua filha? CRÉDITO: THEREZA EUGÊNIA

questões de cinema e de dor

Um filme que é também um processo de cura

Diretor conta como enfrentou traumas do passado para criar o premiado Malu

| 20 dez 2024_10h45
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Na piauí deste mês, o diretor Pedro Freire recorda o atribulado convívio que teve com sua mãe, a atriz Malu Rocha (1947-2013), e como a partir dessa história realizou o filme Malu. Em outubro passado, o longa-metragem ganhou quatro prêmios no Festival do Rio: de melhor filme (dividido com Baby, de Marcelo Caetano), melhor roteiro (Pedro Freire), melhor atriz (Yara de Novaes, que interpreta Malu) e melhor atriz coadjuvante, dividido entre Juliana Carneiro da Cunha (que faz Lili) e Carol Duarte (Joana). Em novembro, no Festival Internacional do Cairo, venceu o prêmio de melhor filme de estreia e de melhor atriz (Novaes).

“Em minha mãe – e também em minha avó – existia uma linha invisível conectando estas duas pulsões aparentemente contraditórias: uma de morte e destruição psicológica, outra de vida intensa através da arte”, escreve Freire. “Isso gerou em mim a certeza de que um dia eu teria que enfrentar essa pessoa genial e confusa que foi Malu Rocha, digladiar-me com ela e tentar fazer dessas memórias aquilo que ela me ensinou como ninguém – arte.”

O filme se concentra no conflito de quatro personagens, umas com as outras, e cada uma consigo mesma: a atriz Malu, cuja carreira ficou estagnada, sua mãe Lili (Juliana Carneiro da Cunha), uma senhora racista e ultracatólica, e sua filha Joana (Carol Duarte), também atriz, além do amigo Tibira (Átila Bee). Entre as três mulheres, há como que um contágio recíproco de traumas. Malu está afastada há anos do teatro, tomada ora pela depressão, ora pela euforia. Não se sabe bem a origem de sua paralisia: se é porque vivenciou a tentativa de destruição da cultura brasileira pela ditadura militar, se é por causa de um passado marcado por abusos de clérigos católicos, ou se é devido à própria mãe, ao casamento desastroso ou ao envelhecimento.

Um dos momentos mais fortes do filme tem sua origem na vida real, como conta Freire: “Aos meus 12 anos, minha mãe teve um surto psicótico. Ficou tatuada na minha memória a tarde em que ela pegou na minha mão e, com um tom grave de voz, como quem estivesse contando sobre uma morte na família, me disse: “Seu pai e sua irmã estão transando.” Eu acreditei. Passaram-se muitos anos até que descobrisse que não era verdade – o que ela mesma admitiu depois, constrangida, quando a confrontei. Malu agia um pouco como Medeia.” 

Além de descrever a difícil elaboração do roteiro de Malu, o diretor rememora as filmagens com o notável elenco de seu filme: “Principalmente me emocionam os silêncios da atriz Carol Duarte, sempre carregados de uma emoção contida e linda, o monólogo em que Juliana Carneiro da Cunha conta uma história terrível do passado, e em que cada frase está completamente trabalhada com imagens interiores, o ator Átila Bee, transtornado, dizendo ‘Eu não vou deixar a sua maldade estragar a minha poesia’, frase que escrevi com medo de soar cafona, mas ficou linda na boca dele. E me emociono com o trabalho radiante de Yara de Novaes, que consegue transitar, em segundos, do olhar cheio de brilho e entusiasmo da atriz Malu ao olhar opaco de uma mulher instável ao extremo.”

Assinantes da revista podem ler a íntegra do texto neste link.

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