“Um lugar qualquer” – tal pai, tal filha
O Nilton comentou comigo há algumas semanas que “Um lugar qualquer” era um filme interessante e que daria margem a mistificações. Costumamos ter nossas divergências mas, desta vez, não posso deixar de concordar com a opinião dele sobre o filme escrito e dirigido por Sofia Coppola. E, além disso, a constatar que foi profético: leiam a crítica de Rodrigo Fonseca, publicada no Segundo Caderno do “Globo” de ontem (27/1/2011) e entenderão por quê.
O Nilton comentou comigo há algumas semanas que “Um lugar qualquer” era um filme interessante e que daria margem a mistificações. Costumamos ter nossas divergências mas, desta vez, não posso deixar de concordar com a opinião dele sobre o filme escrito e dirigido por Sofia Coppola. E, além disso, a constatar que foi profético: leiam a crítica de Rodrigo Fonseca, publicada no Segundo Caderno do “Globo” de ontem (27/1/2011) e entenderão por quê.
Quando vi “Um lugar qualquer” há uns dez dias, o filme me interessou por tratar da banalidade do cotidiano, sem ter nenhum acontecimento espetacular; e, além disso, pelo inegável domínio da linguagem, patente na utilização predominante de planos fixos – qualidades escassas no cinema atual.
Frustrada, porém, pareceu-me a ambição de fazer um filme sobre o vazio. Com perdão pelo jogo de palavras, o máximo que Sofia Coppola consegue é mesmo fazer um filme vazio. Falta substância aos personagens para sustentarem um retrato do tédio.
O primeiro plano talvez seja o que “Um lugar qualquer” tem de melhor. Antes da primeira imagem, ainda com a tela preta, o som de um carro em alta velocidade, passando da direita para a esquerda, define o fora-de-campo: a existência de um espaço além do quadro delimitado pela lente, indicação do limite do próprio cinema e da existência de algo além do que nos é dado ver. O plano geral de uma pista sendo percorrida por um carro esporte, entrando e saindo de quadro, arremata essa bela abertura. Fora isso, resta pouco.
A única diferença significativa entre “Um lugar qualquer” e “Encontros e desencontros”, também de Sofia Coppola, feito em 2003, é ter deixado de lado manifestações preconceituosas em relação aos japoneses, passando a ridicularizar sua própria gente, tanto americanos, quanto ascendentes italianos. Já é alguma coisa!
Sofia Coppola carregará para sempre alguns estigmas. A desastrosa atuação em “Poderoso Chefão – III” é um deles; outro é ser filha de Francis Ford Coppola. O primeiro talvez devesse ser relevado. Afinal, à parte a irresponsabilidade própria da juventude e a vaidade pessoal, ela poderia ter recusado o pedido do pai para assumir o papel e assegurar o cumprimento do cronograma da produção? Do segundo, parece mais difícil se livrar, mesmo fazendo da relação pai-filha um dos principais temas de “Um lugar qualquer”.
Sem ter o lastro do pai, Sofia Coppola revela desconforto semelhante ao dele (ver post de 4/1/11) com seu próprio ambiente profissional, e insatisfação com a linguagem dominante do cinema. Patentes em “Um lugar qualquer”, esse mal estar a leva a pastichar o estilo de célebres diretores europeus da década de 1960.
O Nilton tinha razão: embora seja interessante, “Um lugar qualquer” não passa disso. Mais um espetáculo de segunda mão que a cultura americana tanto valoriza e à qual jornais brasileiros dão tanto destaque.
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Além de especular sobre as razões que teriam levado a Academia a não incluir “Um lugar qualquer” entre os candidatos ao Oscar, reproduzir fofocas, e elogiar a perspicácia do crítico Ely Azeredo, Rodrigo Fonseca tece loas a “Um lugar qualquer”, no “Globo” de ontem, fazendo floreios verbais dignos de nota: “Cleo é a fotossíntese de Johnny, o ‘eclipse’ de sua angústia”, segundo ele.
Feito com “delicadeza”, o filme é, para Rodrigo Fonseca, “uma exegese do tédio a partir de uma relação de paternidade”. Descrição que não é de todo ruim, embora lembre legendas que toda escola de jornalismo ensina a não fazer – as que reproduzem exatamente o que é visto na fotografia. Quanto à “delicadeza” da diretora, não encontro no texto dele nada que justifique o atributo.
O trecho fazendo paralelo entre “Encontros e desencontros” e filmes de Michelangelo Antonioni, merece ser transcrito: “Segundo Ely [Azeredo], ‘águas da incomunicabilidade se agitam’ em ondas de dor por onde os personagens de Sofia caminham, num ‘Blow up’ contínuo que lhes revele a razão da ausência perpétua que lhes governa.”
Asseguro que é exatamente isso que foi publicado. Diante do quê, sem mais, encerro aqui este post.
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