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Versão brasileira – parte 2

Zeca Baleiro | 03 out 2013_15h27
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Na infância do rock brasileiro, as versões quase que viram monopólio no mercado musical tupiniquim. Craques como Erasmo Carlos, Getúlio Côrtes e Fernando César (autor da versão de Marcianita, um dos maiores arrasa-quarteirões da jovem guarda), mas sobretudo Rossini Pinto e Fred Jorge, dominaram a cena entre o final dos anos 50 e os 70. O primeiro fez ousadas versões do francês, do italiano, do espanhol e do inglês, e de autores como Lennon e McCartney e Nino Rota, entre tantos – são dele Ternura, Fale Baixinho, Mar de Rosas, Domingo Feliz e mais um balaio de sucessos inquestionáveis –, e o segundo, versionista de Neil Sedaka e Paul Anka, é dono de hits como Banho de Lua, Estúpido Cupido, Oh Carol e Diana. Brancato Jr., na época empresário da banda Os Incríveis, acertou na mosca ao escrever a versão em português para a canção italiana C’era um ragazzoche come me amava i Beatles i Rolling Stones, de M. Luzini e F. Migliacci.

Gilberto Gil se aventurou poucas vezes, mas sempre com êxito na difícil seara das versões. No, Woman, no Cry e I Just Called to Say I Love You são casos exemplares de versões bem urdidas (e no segundo caso, superior à original, na minha modesta, mas vaidosa opinião). Chico Buarque também verteu com maestria canções italianas (Gesu bambino, de Lucio Dalla, e as canções de “Os Saltimbancos”, do bardo Sergio Bardotti) e cubanas (Yolanda e De Qué Callada Manera, de Pablo Milanés).

Ronaldo Bastos é outro mestre das versões. Entre seus grandes acertos, estão Quando te Vi, versão para Till There Was You, de Meredith Wilson e gravada pelos Beatles, e Nada Mais, para Lately, de Steve Wonder. Bob Dylan seria um autor “difícil de verter”, segundo os entendidos, por causa da poesia densa e engenhosa de seus versos. Mas Caetano Veloso e Péricles Cavalcanti fizeram cair por terra esta máxima de botequim ao escreverem a linda Negro Amor, a partir de It’s All Over Now, Baby Blue. Dylan também ganharia versão de outro poeta messiânico como ele, o paraibano Zé Ramalho, em Batendo na Porta do Céu, que consegue resultado curioso ao trocar corajosamente o mítico refrão “knock knock knockin’ on heaven’s door” pelo literal “bate, bate, bate na porta do céu”.

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Há dois casos dignos de nota, que se encaixam naquela categoria “versões que superam o original”: Eu vou ter Sempre Você, que Antonio Marcos escreveu a partir de You’ll Never Know, de M. Gordan e H. Warren, e Bem que se Quis, feita por Nelson Motta para E Po’ Que Fa, do compositor napolitano Pino Daniele.

Naturalmente, há os casos das versões infelizes ou declaradamente infames, e este assunto renderia outro longo texto. Pra não me estender demais, focarei em um caso recente, a versão que Ana Carolina e Seu Jorge fizeram para a canção do irlandês Damien Rice – The Blower’s Daughter, trilha do filme Closer. Em português, versos como “and so it is” transformou-se no pra lá de coloquial “é isso aí”, e o belo refrão “I Can’t Take my Eyes off You”, que em inglês soa lírico e ultrassonoro, virou o inimaginável verso “eu não sei parar de te olhar”.

Este meu texto tem lapsos, é óbvio. “Versões brasileiras” é um assunto que renderia uma pequena bíblia. Paro por aqui. Deixo a função para os pesquisadores de plantão.

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