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A volta dos redivivos

Maioria dos candidatos à Câmara já disputou pelo menos uma eleição; partidos com maiores bancadas são os que menos renovam

Alexandre Aragão | 29 ago 2018_10h44
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A procura do eleitor pelo novo, um dos motes da campanha deste ano, não se refletiu na escolha dos candidatos à Câmara dos Deputados. Um levantamento feito pela piauí com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral mostra que 4.820 (59%) dos 8.235 candidatos a deputado federal já disputaram algum cargo eletivo nos últimos 20 anos. Dos 613 parlamentares que passaram pela Câmara na atual legislatura – 513 eleitos diretamente e 100 suplentes que assumiram o cargo em algum momento –, a maioria (407, ou 66%) tenta a reeleição.

Se as regras eleitorais deste ano – com tempo de campanha menor que em 2014 e a divisão do dinheiro concentrada nos partidos – por si só já dificultam a renovação, as siglas mais estabelecidas aprofundam essa distorção ao escolher menos novatos que a média.

Os partidos menos arejados são exatamente os que têm as maiores bancadas na Câmara. Pouco menos de um quarto (24%) dos candidatos do PP, partido com o maior número de deputados investigados no Supremo Tribunal Federal, disputam em 2018 sua primeira eleição. As siglas que completam a lista dos menos renovados são PR (25% de novatos), DEM (25%), MDB (26%), PT (28%) e PSDB (30%).

Entre os velhos conhecidos que voltam a aparecer na urna está Ricardo Murad, que disputou sua primeira eleição há 36 anos. Ao longo da trajetória, houve tempo para o ex-deputado maranhense aproximar-se e distanciar-se do clã Sarney. Na campanha de 1994, denunciou o uso da máquina pela cunhada, a ex-governadora Roseana Sarney (MDB). Depois, no último mandato dela, em 2011, deixou a assembleia estadual e assumiu a Secretaria de Saúde, onde permaneceu durante a eleição de 2014.

Agora, depois de oito anos sem disputar um cargo eleitoral, Murad trocou o MDB pelo PRP – sétimo partido de sua carreira – para concorrer ao governo do Maranhão, mas desistiu. Vai apoiar Roseana. E busca uma vaga na Câmara pela segunda vez. Sobre as regras desta campanha, o candidato reclamou: “Depois que mudou a legislação, com as emendas impositivas e o fundo partidário dominado pelas cúpulas, a disputa ficou muito desigual para quem não tem mandato ou que pertence a partidos que não têm fundo significativo”.

Como Murad, muitas outras figuras conhecidas reapareceram este ano – são os 1.198 candidatos redivivos (15% do total), aqueles que já foram eleitos pelo menos uma vez, deixaram de disputar uma ou mais eleições e, agora, ressurgem. Há casos de ex-deputados que tentam voltar à Câmara, políticos abatidos no passado por escândalos de corrupção e candidatos que já são familiares ao eleitor por terem ocupado outros cargos.

Segundo partido que menos renova, o PR abre pouco espaço para neófitos mesmo em seus principais redutos. No Espírito Santo, por exemplo, de onde vem um de seus quadros populares, o senador Magno Malta, não há nenhum novato disputando pelo partido. A mulher do senador, a cantora gospel Lauriete Malta (PR), não concorria desde 2010, quando foi eleita deputada federal pelo PSC com 69 mil votos, e agora retorna por uma vaga na Câmara. Ela conta que não tentou a reeleição porque a filha, a cantora gospel infantil Júlia, hoje com 13 anos, pediu que passasse mais tempo em casa. “Agora, o momento do Brasil pede que vozes como a minha se coloquem”, disse Lauriete, citando “valores cristãos”, “a luta contra a ideologia de gênero” e “a família” como motes de campanha.

O PT também está entre os que menos renovaram. Em São Paulo, quadros que estavam distantes das urnas por causa da estrutura partidária voltam ao páreo – como Rui Falcão, presidente da sigla entre 2011 e 2017, e o tesoureiro da campanha à reeleição de Dilma, José de Filippi Júnior. Eles não disputavam uma eleição desde 2010. É uma mostra de que, pelo menos em relação à Câmara, o “novo projeto de organização partidária” que Lula pregou para o PT em 2015, quando disse que o partido “está velho”, continua só no discurso.

Entre os tucanos a situação não é diferente. O senador Aécio Neves (PSDB), que concorreu à Presidência em 2014, é um dos que reencarnam nesta eleição tentando uma vaga de deputado federal. Dos 250 candidatos tucanos, 176 (70%) já disputaram alguma eleição – e, desse total, 110 (44%) já saíram vitoriosos pelo menos uma vez.

No partido do presidente Michel Temer, o MDB – que fez a segunda maior bancada de deputados em 2014 e tem a maior capilaridade entre as siglas brasileiras –, não há nenhum novato concorrendo em seis dos 26 estados, todos no Norte e Nordeste: Amazonas, Rio Grande do Norte, Piauí, Roraima, Pernambuco e Tocantins.

Na ponta oposta, entre os que mais renovam estão partidos recém-criados. O Novo é, em termos percentuais, a sigla que tem mais neófitos: 202 (89%) de seus 228 candidatos a deputado fazem sua primeira incursão eleitoral. Em termos absolutos, o PSL do candidato Jair Bolsonaro foi o que lançou mais neófitos: são 274 candidatos, 58% do total de 471.

 

Mesmo entre os candidatos que nunca disputaram uma eleição, há nomes conhecidos. Um dos neófitos de quem alguns eleitores já ouviram falar é o ex-ministro da Previdência Social Carlos Gabas (PT), que integrou os governos Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2016). Fã de motos Harley-Davidson, Gabas ficou famoso por fazer passeios em Brasília com a ex-presidente na garupa na época em que era ministro.

“Eu já tinha cogitado ser candidato em 2010, o presidente Lula pediu para eu não sair [do governo]”, disse Gabas à piauí. “Chegou 2014, a presidenta pediu pra eu não sair. Então, também não fui.” Agora, o petista diz que “a conjuntura impõe que seja candidato”. “A gente sofreu muito na saída do governo. Fui acusado de pedir dinheiro para o PT, de ser parte do quadrilhão do PT, e isso é muito doloroso”, afirmou Gabas, que foi alvo de mandados de busca e apreensão na Operação Custo Brasil, um desdobramento da Lava Jato. “Abri sigilo bancário, fiscal, telefônico. O [ex-ministro da Justiça] Zé Eduardo Cardozo me disse: ‘Gabas, o que estão dizendo aqui é o seguinte: pô, esse cara nem uma amantezinha tem’.”

Entre os candidatos neófitos à Câmara há 99 policiais militares – mais do que os 67 PMs que também disputam uma vaga para deputado, mas que já concorreram pelo menos uma vez. A profissão de policial é uma das mais numerosas entre os estreantes. Somados os 18 candidatos que vieram da Polícia Civil, os agentes de segurança pública são mais numerosos do que os servidores públicos federais (108), por exemplo, e só perdem para empresários (372 candidatos neófitos com essa profissão), advogados (260), professores (214) e estudantes (123).

Alguns dos candidatos PMs, apesar de nunca terem feito parte de nenhum governo, já têm base eleitoral definida. Um dos neófitos do menos renovado PP, por exemplo, é o tenente da Rota Guilherme Derrite, cujo padrinho político é o deputado estadual Coronel Telhada (PP), da bancada da bala da assembleia paulista. Com 1,7 milhão de seguidores no Facebook, Derrite ganhou fama ao publicar vídeos de ações policiais, e costuma elogiar Telhada e outros integrantes da Rota. Na campanha por ocupar uma vaga na Câmara em 2019, o neófito usa uma plataforma conhecida, e em alta nesta eleição.

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