"Me desculpe parecer grosseira, mas a encomenda não é minha, se o senhor diz o que diz é porque não faz ideia do que está acontecendo." FOTO: YRJÖ EDELMANN_GALLERI GKM SIWERT BERGSTRÖM
Policarpo Azêdo, 35
Deve haver alguma cláusula na Declaração Universal dos Direitos do Homem que garanta ao cidadão o sagrado direito de ser tão infeliz quanto quiser
Paulo Henriques Britto | Edição 99, Dezembro 2014
Vou lhe contar o que aconteceu, mas não para insinuar que de algum modo a culpa é sua. Não quero em absoluto dar a entender que você é responsável pela vida que estou levando agora, ou pelos aspectos mais incômodos dessa vida. Quanto a isso você pode se tranquilizar; não culpo ninguém por nada, aliás nem acho que seja uma questão de culpa. Pois de certo modo minha existência agora, bem pesados os prós e os contras, está longe de ser insuportável, talvez seja até melhor do que antes; às vezes chego a pensar que minha atual situação é, sob certos aspectos, invejável. Afinal, sou dono do meu nariz; depois que chego do trabalho, pontualmente às sete e meia todos os dias, de segunda a sexta, faço o que me dá na telha, não dou satisfação a ninguém. Se resolvo sair, saio; se acho melhor ficar em casa lendo um livro, fico em casa lendo um livro. Ou melhor: quando me dá vontade de sair, não saio; quando desejo ficar em casa, saio. É isso que as pessoas chamam de liberdade, não é? Se não é, devia ser.
Certo, não posso dizer que eu seja uma pessoa feliz. Bem, ninguém disse que a liberdade era garantia de felicidade, não é? E mesmo que dissesse, eu é que não ia acreditar. Mas a questão não é essa, e sim esta outra: Por que é que a gente tem que ser feliz? Onde que está escrito que a gente tem essa obrigação? Deve haver alguma cláusula na Declaração Universal dos Direitos do Homem que garanta ao cidadão o sagrado direito de ser tão infeliz quanto quiser, de infernizar a sua própria vida o quanto quiser – infernizar a vida alheia são outros quinhentos, sobre isso não digo nada; falo apenas sobre o direito de optar pela infelicidade, pelo prazer maligno de negar a si próprio todas as coisas pelas quais as pessoas se estapeiam pela vida e pelo mundo afora, e procurar exatamente aquilo que todo mundo evita. Mas isso, repito, não tem nada a ver com você, nada a ver com nada que você tenha feito ou deixado de fazer; é uma questão minha, exclusivamente minha.
O que eu quero lhe contar, apenas por achar que você tem o direito de saber, é uma coisa até simples, que aconteceu pouco mais de um mês depois que você foi embora. Começou no metrô – eu estava sentado num vagão apinhado de gente, cansado, quando vi uma mulher parada na minha frente, também cansada, mas bem mais moça que eu, carregando uma sacola grande, não necessariamente pesada, mas grande, sim. A multidão empurrava a mulher quase para cima de mim, e a sacola estava perigosamente próxima da minha cara, balançando cada vez que o metrô freava ou dava a partida; a qualquer momento, um movimento mais brusco e eu seria atingido, disso não havia dúvida. E foi mais por esse motivo do que por qualquer outro que me ofereci para segurar a sacola da mulher: para não levar uma sacolada no nariz quando eu menos esperasse. Cheguei a pensar em me levantar e ceder meu lugar a ela, mas o cansaço me fez conter o impulso cavalheiresco e apenas me ofereci para segurar a sacola. Para tirar meu nariz da reta, só por esse motivo – que isso fique bem claro.
Pois bem, a mulher me agradeceu efusivamente, muito mais do que eu esperava, pois afinal a sacola nem era tão pesada assim; continuei sentado, com a sacola da mulher no colo, não pensando em nada em particular. À minha esquerda havia um velho, e à direita – esqueci quem estava à direita, o que deve significar que esse detalhe não tem importância. Ou então que é tão importante que eu reprimi a lembrança, com essas coisas nunca se sabe. Ou até os outros sabem, alguém sabe – mas eu, não. O que havia dentro da sacola eram caixas quadradas; quer dizer, para ser mais técnico, se você me permite um pouco de tecnicismo, caixas em forma de paralelepípedo, volumosas, de papelão, várias delas, uma em cima da outra, de modo que sem ter que abaixar muito a cabeça dava para apoiar o queixo sobre a que estava por cima, e foi o que acabei fazendo; isso me permitiu relaxar aos poucos toda a musculatura, começando com o pescoço, depois os ombros, em seguida a coluna toda, e assim fui gradualmente mergulhando num sono não de todo desagradável, talvez sono seja exagero, modorra é a palavra mais apropriada, uma modorra suave, que os movimentos do vagão não chegavam a perturbar por completo, mas seja como for o fato é que por algum tempo cheguei a me desligar de tudo que me cercava, digamos que cochilei um pouco, a modorra foi se transformando num cochilo – até que de repente alguma coisa me fez voltar a mim, ou ao vagão do metrô, por assim dizer, e quando levantei a cabeça e olhei para a frente a mulher havia sumido. Olhei para os lados, imaginando que ela tivesse encontrado um lugar para sentar e não tivesse retomado a sacola para não me incomodar; me virei para a esquerda, depois para a direita, mas a mulher não estava em lugar nenhum naquele vagão, o velho antes sentado à minha esquerda havia sumido, quem quer que tivesse estado à minha direita também tinha ido embora, o vagão estava quase vazio. E em seguida me dei conta de uma outra coisa: a estação seguinte era a estação final, a minha meta, e logo o metrô parou, todos nos levantamos, os poucos que ainda estávamos no vagão, e saí carregando a sacola da mulher, imaginando que por algum motivo ela devia ter trocado de vagão, muito embora eu soubesse que é difícil passar de um vagão para o outro, para isso ela teria que saltar numa estação, andar com passo apressado até a porta do vagão ao lado e entrar nele, sabe-se lá movida por quais impulsos misteriosos, pois as pessoas são capazes de fazer coisas ainda mais absurdas que essa; mas enfim, por algum motivo e de algum modo, a mulher teria dado um jeito de trocar de vagão e estaria agora à minha espera lá fora, na plataforma, para que eu lhe devolvesse a sacola. Só que ela não estava na plataforma, as pessoas foram indo embora, a pequena multidão foi se dispersando até que só restei eu, e também eu comecei a subir a escada, carregando a sacola da mulher, ainda acreditando – Ah, a necessidade humana de acreditar até nas maiores improbabilidades! – que ela haveria de estar me esperando lá fora, me esperando para que eu lhe devolvesse a sacola e depois pudesse me dizer: Obrigada, o senhor é muito gentil.
Mas ela não estava lá. E foi só quando me vi na praça, com a sacola na mão, que me dei conta de que devia ter deixado a sacola na estação do metrô, na seção de achados e perdidos, sem dúvida haveria uma seção de achados e perdidos na estação, tinha que haver, e se não houvesse eu devia ter entregado a um segurança do metrô, um daqueles homens de uniforme preto um pouco sinistro, que passam o dia inteiro andando de um lado para o outro da estação sussurrando coisas indecifráveis em seus walkie-talkies. Mas agora era tarde, eu já havia saído da estação, e por algum motivo me convenci de que entrar na estação outra vez atentaria contra a minha dignidade, ou contra a lógica, duas coisas que levo muito a sério. Agora não havia mais como encontrar a mulher, e assim fui caminhando em direção a meu apartamento, numa daquelas ruelas tortas que fazem a ligação de Copacabana com Ipanema pela porta dos fundos, por assim dizer, carregando a sacola da mulher desconhecida. Cheguei ao meu prédio segurando a sacola com a mão esquerda – não me pergunte por que não pus a sacola no chão, o que facilitaria muito as coisas –, segurando a sacola com a mão esquerda enquanto tirava do bolso o chaveiro com a direita, e com a mesma mão abri o portão, porque o prédio não tem porteiro, como você sabe perfeitamente, entrei, subi dois lanços de escada, porque o prédio não tem elevador, como você também sabe, abri a porta do apartamento e entrei. Só depois que entrei foi que larguei a sacola no chão, acendi a luz e fechei a porta.
E então, finalmente, resolvi abrir a sacola. Várias caixas de papelão leves, conforme o previsto, que pareciam conter roupas; não abri nenhuma delas, não havia motivo para abrir aquelas caixas que afinal de contas não eram minhas; e no fundo da sacola um envelope. O envelope estava endereçado a uma pessoa. O nome era Maricleide Simas, um nome que me pareceu improvável, mas quem sou eu para julgar essas coisas, e o endereço era uma rua na Tijuca – não que eu conhecesse a rua, mas pesquisei e descobri que ficava na Tijuca, ou num lugar mais ou menos entre a Tijuca propriamente dita, a Tijuca essencial, se me for permitido um pouco de platonismo, algo que acredito que você me permitirá, e Vila Isabel, uma rua aonde eu nunca tinha ido: rua Desembargador Policarpo Azêdo, número 35, uma casa, portanto, uma casa na Zona Norte. E na mesma hora, antes mesmo de executar minha pequena rotina de volta ao lar, que não é nenhum ritual maçônico, mas também não é uma coisa totalmente sem importância para mim – o que seria de mim se não fossem essas pequenas rotinas! –, antes mesmo de, por assim dizer, terminar de chegar em casa, tomei a firme decisão de ir ao tal endereço no dia seguinte, que era sábado, levando a sacola, com o firme propósito de restituir o que nela havia à pessoa que devia ser sua legítima proprietária. Você registrou isso? Então vamos em frente.
No dia seguinte, acordei um pouco mais cedo do que costumo acordar aos sábados, animado talvez pela perspectiva daquela pequena aventura, percorrer todo o trajeto de uma linha do metrô de ponta a ponta, carregando aquela sacola não pesada mas volumosa, até uma rua ignota da Tijuca, bairro onde eu praticamente não punha os pés desde a longínqua infância, pois era na Tijuca que morava uma espécie de tia que eu ia visitar com meus pais religiosamente uma vez por ano, sempre numa festa de aniversário em que eram servidos uns bombons recheados de licor de jenipapo que nunca mais vi em lugar algum, cuja confecção era provavelmente uma das prendas daquela suposta tia, uma prenda que, ainda que cinquenta anos antes possivelmente valesse alguma coisa, naquela época já não tinha qualquer valor, pois se tivesse ela não teria morrido, como de fato acabou morrendo, solteirona. Me levantei cedo, dizia eu, corri os olhos pelo jornal, saí, tomei uma média e comi um pão com manteiga na padaria da esquina, e submergi na estação do metrô. Entrei num vagão pouco cheio, me sentei, a composição, como dizem eles, deu a partida, respirei fundo, antecipando uma viagem longa, trinta, quarenta minutos, que sabia eu, que nunca tinha ido de metrô à Tijuca. Ir de metrô à Tijuca me parecia vagamente uma espécie de anacronismo, uma combinação insólita de passado com presente, algo assim como assistir à queda do Segundo Império ao vivo e a cores, pelo noticiário da televisão.
Depois que o trem entrou em movimento me ocorreu que eu devia ter trazido o jornal, embora carregar a sacola e o jornal ao mesmo tempo não fosse muito prático; mas, afinal, o percurso do meu prédio até a estação do metrô é bem curto, e depois eu poderia abandonar o jornal já devidamente lido no banco do metrô, onde ele talvez viesse a ser recolhido e usufruído por um outro passageiro, em vez de ficar largado sozinho num apartamento vazio. E fiquei durante alguns instantes – não me pergunte quantos que eu não saberia dizer, mas é claro que você não vai me perguntar nada – visualizando uma cena de certo modo melancólica: o jornal, mal e porcamente lido, abandonado na mesa de centro, ao lado de um cinzeiro que ninguém mais usa. Quando dei por mim estava com os olhos fixos na mulher sentada à minha frente, porque meu banco era desses que se estendem ao longo da parede, em frente ao qual fica um banco perpendicular a ele, de modo que a mulher estava de lado para mim, mas de algum modo, com o rabo do olho, vá lá a pequena incongruência anatômica, ela percebeu que eu estava olhando para ela, e reagiu como se meu olhar fosse uma espécie de agressão, assim como alguns povos antigamente chamados de primitivos acham que tirar uma fotografia deles tem o efeito de lhes roubar alguma coisa, a alma ou coisa parecida. Mas, como não somos mais primitivos – nem mesmo chamamos mais de primitivos os primitivos, o que seria uma forma condenável de primitivismo se fosse lícito rotular algo de primitivismo –, não vejo motivo para que eu não possa olhar fixamente para a pessoa sentada à minha frente; e por isso continuei olhando para ela, até que, incomodada, a mulher mudou-se para outro banco, afinal era sábado, havia outros bancos desocupados. Eu havia olhado fixamente para aquela mulher porque alguma coisa nela me lembrava a outra, a da véspera, a que havia largado a sacola comigo, mas antes que ela se levantasse eu já tinha concluído que a semelhança não era tão grande assim, que no fundo era mais uma tentativa da minha parte de tornar interessante aquela viagem de metrô em que absolutamente nada ia acontecer, uma previsão que, para espanto nenhum meu, de fato acabou se realizando.
Trinta e poucos minutos depois – não sei exatamente quantos, consultei o relógio quando chegamos à estação Sáenz Peña, mas como não tinha visto as horas no momento da partida não cheguei a conclusão nenhuma – saltei do metrô, emergi numa praça Sáenz Peña muito diferente da que eu guardava na memória, as únicas coisas que permaneciam iguais eram as montanhas da Tijuca ao fundo, e talvez o monumento ao radioginasta também, imagino que sim, não fui conferir, certamente não teria havido motivo para fazerem uma desfeita aos radioginastas e retirarem aquela homenagem a eles, quiçá a única existente no mundo, e saí em direção à rua Desembargador Policarpo Azêdo, que segundo o mapa ficava a uns oito ou nove quarteirões dali, talvez mais, mas eu não estava com pressa nenhuma, estava indo em direção a uma ruazinha desconhecida para mim e para a grande maioria da população da cidade, para não falar na humanidade; era um dia quente, nublado, as ruas estavam mais vazias do que eu esperava encontrá-las, e quanto mais me afastava da praça mais vazias elas iam ficando, de modo que senti estar mergulhando na Tijuca profunda, num daqueles bairros ou sub-bairros de nomes nostálgicos, Aldeia Campista, Andaraí, até que, dobrando uma esquina que parecia saída dos porões da minha infância, se é que a infância tem porões, entrei numa travessa estreita onde, se houvesse justiça no mundo, três ou quatro moleques descalços deveriam estar jogando bola, mas não, não havia ninguém na rua, verdadeiramente não há justiça neste mundo, que afinal é o único mundo que há.
A rua Desembargador Policarpo Azêdo era bem pequena, muito menor do que seu próprio nome; num mundo em que houvesse não apenas justiça como também lógica, o nome dela seria travessa Dona Amélia ou rua do Sabão ou algo do mesmo calibre, jamais rua Desembargador Policarpo Azêdo, com circunflexo redundante e tudo; eu havia me enfiado num recanto da cidade aonde a reforma ortográfica de 1971 ainda estava por chegar. De saída não consegui encontrar o número 35, passei direto do 33 para o 37, os dois separados por um arco pequeno; o 37 era um prédio de três ou quatro andares de uma feiura indescritível, vá lá o clichê, quiçá o prédio mais feio de toda a cristandade, parecia ser só fundos, não era possível que os fundos dele tivessem mais cara de fundos do que aquela fachada, se fachada era; mas depois de algum tempo percebi uma placa meio descorada abaixo da placa do 37, que em caracteres não muito grandes dizia 35 FUNDOS, e compreendi que, se passasse por debaixo daquela espécie de porta-cocheira para carruagens projetadas para anões, e certamente puxadas por pôneis, situada entre o 33 e o 37, eu haveria de encontrar, atrás do 33 e do lamentável 37, uma casa, a qual haveria de ser o 35. Avancei, pois, e encontrei, do outro lado de um pequeno pátio onde uma mangueira razoavelmente frondosa resistia ao garrote de cimento com que estavam tentando sufocá-la, encarando, tal como eu havia encarado a falsa Maricleide Simas no metrô, os fundos do 37, que eram ainda mais horrendos que a fachada – encontrei, dizia eu, a provável casa da verdadeira, ainda que de nome improvável, Maricleide Simas.
Como você vê, até agora eu estava agindo de maneira perfeitamente razoável, se se pode dizer que é razoável enfrentar uma viagem de mais de meia hora de metrô e uma caminhada de não sei quantos quarteirões nas profundezas da Tijuca para entregar à putativa destinatária uma sacola esquecida no metrô por uma completa desconhecida, e numa manhã de sábado ainda por cima. Para você ver a que extremos são levadas pela falta do que fazer as pessoas cujas vidas são inteiramente desprovidas de sentido. Não que eu esteja culpando você por isso, bem entendido. Por outro lado, é claro que você, numa tal situação, teria me alertado para a possibilidade de que a mulher do metrô não houvesse esquecido a sacola no meu colo, e sim que tivesse se livrado dela de propósito. Eu teria replicado, é claro, que uma tal ideia só poderia ser fruto da paranoia; afinal, ninguém entra num metrô cheio carregando uma sacola com a intenção de livrar-se dela – seria esse meu argumento. Mas você nunca levou a sério meus argumentos, jamais se dignou a levá-los em consideração, de modo que eu teria assim mesmo, ou talvez por isso mesmo, para contrariar você, feito a romaria que acabei fazendo. Em suma: não mudaria nada. Como se vê, e como já foi dito, não estou de modo algum culpando você por nada.
Mas divago. Antes de divagar, eu estava diante da porta do 35, segurando uma sacola não pesada, mas grande, incômoda de carregar, um trambolho leve, ou um leve trambolho, se você me permite um ligeiro oximoro. Bom. Larguei no chão a sacola, que ficou em pé – ela continha, como já tive oportunidade de dizer mais de uma vez, uma pilha de caixas, de modo que se equilibrava em pé sem nenhum problema –, e toquei a campainha. Não precisei esperar muito. A porta foi aberta por uma mulher, não a mulher do metrô da véspera, nem a do metrô daquela manhã, mas uma terceira mulher, um pouco mais velha que as duas outras, mais baixa e mais gorda. Fui logo dizendo: Bom dia, minha senhora, eu gostaria de falar com a dona Maricleide, ela está? A mulher sorriu muito, não disse nada e fez sinal para que eu entrasse. Entrei numa sala pequena, acanhada, com um sofá e duas poltronas, os três descasados um do outro, e uma mesa de centro com pés de palito, safra 1959, mais ou menos; a mulher continuava olhando para mim e sorrindo. Me dei conta de que havia uma voz ao fundo, uma voz também de mulher – a quarta mulher dessa história, contando com as duas anteriores, a do metrô de sexta e a do metrô de sábado, portanto, a mulher nº 4 – falando ao telefone, era essa a impressão que dava, repetindo as mesmas coisas sem parar, com uma voz que exprimia algo assim como incredulidade, uma recusa a acreditar no que estava ouvindo. Enquanto isso, a mulher nº 3, sem dizer nada, fez sinal para que eu me sentasse, e desapareceu no interior da casa enquanto eu largava a sacola em cima da mesa de centro. Ao fundo, a voz da nº 4 prosseguia: Não, não pode ser, deve haver algum engano. Não, absolutamente, isso não pode ser. Eu… um momento, por favor. A voz da nº 4 sofreu uma queda abrupta de intensidade, imaginei que ela estivesse conversando baixinho com a nº 3, ou melhor, falando com ela, porque eu continuava ouvindo apenas uma versão reduzida da voz original, fazendo perguntas; as supostas respostas da nº 3, se as havia, eu não ouvia, ainda que pudesse imaginá-la respondendo; percebi um tom de rispidez nos cochichos da nº 4, que logo em seguida reassumiu sua voz telefônica. Aos poucos minha atenção foi se despregando daquela conversa unilateral, e entreguei-me a uma daquelas minhas especulações vagas que você conhece tão bem, pensando algo mais ou menos assim: Pois é isto que é a vida, a espera numa sala de visitas desconhecida, ouvindo uma conversa sobre um assunto desconhecido, esperando a hora de ser atendido por uma pessoa desconhecida, para lhe falar de uma sacola que me fora legada – por algum motivo a palavra “legada” me pareceu perfeitamente apropriada naquele momento – por uma desconhecida no metrô. E, igualmente por algum motivo, essa percepção me pareceu uma coisa profunda, ou pelo menos uma coisa concreta, ou mais ou menos concreta, a ser extraída dessa expedição tijucana, para que ela não acabasse resultando numa absoluta perda de tempo. Mas antes que eu pudesse desenvolver essa ideia, se é que era mesmo uma ideia, fui interrompido pela entrada em cena da nº 4.
A nº 4 era uma mulher alta, descabelada, com cara de cavalo selvagem, mais ou menos da idade da nº 1, a mulher da véspera do metrô, ou do metrô da véspera, melhor dizendo, mas que sem dúvida não era ela, ainda que pudesse perfeitamente ser Maricleide Simas – qualquer mulher desconhecida, pensando bem, pode ser Maricleide Simas. A mulher nº 4 me olhou de alto a baixo, pediu desculpas pela Mariinha (a mulher nº 3, pude inferir), que a Mariinha era meio surda e não entendia bem as coisas, ela já tinha falado pra Mariinha 400 mil vezes pra não deixar entrar na casa qualquer pessoa que tocasse a campainha, mas não adiantava. Em outras circunstâncias eu poderia tomar aquela afirmativa – que, afinal, equivalia a dizer que eu era qualquer pessoa, o que muito provavelmente implicava que eu era uma pessoa qualquer – como uma ofensa; mas talvez por ser uma manhã de sábado, e por eu estar talvez na Aldeia Campista, ou por alguma outra razão, não me senti atingido pelo comentário, ou resolvi que não me sentia atingido, o que no final das contas vem a dar no mesmo. Assim, me levantei, me empertiguei bastante, acho que para deixar claro que, se ela era alta, eu era mais alto ainda, e disse, com o máximo de dignidade de que sou capaz: Minha senhora, peço desculpas por estar me intrometendo na sua manhã de sábado, imagino que a senhora não deve entender por que motivo estou aqui, por isso quero justificar logo minha presença, e assim falando indiquei, com um gesto ao mesmo tempo didático e magnânimo, a sacola pousada na mesa de centro, entregando à mulher nº 4, sem maiores explicações, o envelope endereçado a Maricleide Simas – limitando-me a enfatizar que minha investigação acerca dos conteúdos da sacola fora a mais abreviada possível, não indo além da leitura do exterior do envelope, o qual, muito embora não estivesse lacrado, eu não havia aberto, tal como não havia aberto as caixas. Minha exposição foi sumária, clara, absolutamente objetiva, tanto assim que me senti orgulhoso, cheguei a desejar que você estivesse ali ao meu lado, me ouvindo, para que depois fosse forçada a admitir que dessa vez, ao menos, meu desempenho estava acima de qualquer crítica, que eu havia me saído tão bem naquela situação quanto era possível; nem mesmo você haveria de encontrar o que criticar.
Mas a reação da nº 4 foi muito diferente do que eu esperava – o que talvez não queira dizer muita coisa, já que não faço a menor ideia do que eu esperava. Ela ficou como que estupefata por uns dez ou quinze segundos, olhou para mim, para a sacola, e explodiu: Mas é o cúmulo da desfaçatez! É o cúmulo! Depois de tudo que me aprontam, mais essa! E continuou a se indignar em altos brados, olhando para mim, mas não exatamente se dirigindo a mim, de modo que por algum tempo não consegui entender se a indignação dela era voltada contra a minha pessoa ou contra outra pessoa, talvez a mulher nº 1, ou a nº 3, vulgo Mariinha, ou a alguma outra pessoa, ou mesmo a todas elas. Esse ponto ainda não estava totalmente esclarecido quando a nº 4 largou o envelope dentro da sacola, deu as costas para mim e voltou para o interior da casa; uma porta bateu com força e a voz da nº 4 fez-se ouvir como antes, só que agora não dava para compreender as palavras, ela falava sem parar, com umas pausas de vez em quando, que deviam ser as intervenções da Mariinha, se é que a Mariinha era capaz de falar, o que até então não havia sido demonstrado a ponto de sobrepujar meu natural ceticismo a respeito dessas coisas, ou das coisas em geral. Eu estava um pouco decepcionado, é claro; no meu entender, tinha feito tudo da maneira mais correta possível, tinha me esforçado ao máximo para colocar os interesses da sociedade acima dos meus, tinha ido de um canto da cidade ao outro numa manhã de sábado, carregando uma sacola que não era minha – e era essa a recompensa que me davam! Uma tremenda injustiça, você há de concordar, eu espero. Realmente, não há justiça nenhuma no mundo.
Bem, os minutos se passavam, a voz da nº 4 foi morrendo aos poucos, e nada acontecia. Sentado no sofá da sala, eu esperava; creio que cheguei mesmo a cochilar um pouco. Quando espertei, algum tempo depois, a casa estava inteiramente silenciosa. Levantei-me, espreguicei-me, pigarreei alto, na tentativa de chamar a atenção das duas mulheres, mas não adiantou. Ousei então enveredar pelo corredor, pigarreando a cada dois ou três passos; a outra opção seria chamar pela Mariinha – o único nome que eu tinha além do de Maricleide Simas, nome infausto que ainda não me sentia suficientemente seguro do enredo da saga em que havia me enfiado a ponto de ousar pronunciar; além disso, mais uma vez, enunciar tal nome, naquelas circunstâncias, me parecia incompatível com a minha dignidade. Ah, os infortúnios causados por uma concepção demasiado exaltada da dignidade! Resolvi, pois, imbuir-me do espírito do explorador, ou do etnólogo – Afinal, eu não estava em plena expedição às mais remotas Tijucas? –, e explorar a casa. Numa direção, o corredor dava para a cozinha; pus a cabeça lá dentro e não vi ninguém; na outra, havia três portas, duas fechadas e uma entreaberta, esta última a do banheiro. Aproveitei para usar o banheiro, afinal de contas eu estava precisado de um banheiro, e não havia ninguém a quem pedir permissão. O cheiro de spray desinfetante era forte. A descarga era positivamente escandalosa, e levou um bom tempo para se aquietar. Abri a torneira para lavar as mãos, e saiu um jorro tão caudaloso que espirrou água na minha camisa. Quando saí do banheiro, as duas outras portas continuavam fechadas. Resolvi bater numa delas – tendo ido tão longe, recuar agora seria uma covardia. Você ficará orgulhosa de mim, creio eu, ao ficar sabendo que de fato ousei bater na primeira porta. Esperei um pouco, bati de novo, ouvi uma vozinha fraca vindo de dentro: Pode entrar, Mariinha. Abri uma nesga de porta e disse: Sou eu. Mantive a porta milimetricamente entreaberta; depois de uma pausa de hesitação, imagino eu, a voz disse, um pouco mais alto: O senhor pode entrar.
Encontrei a nº 4 sentada numa espécie de bergère obesa, ao lado de uma cama de solteiro, fumando um cigarro junto a uma janela gradeada, que dava para aquela espécie de pátio que havia à frente da casa. Ela olhou para mim um pouco envergonhada, pelo menos foi a impressão que tive, parecia prestes a me pedir desculpas, e eu estava plenamente disposto a perdoá-la, mesmo que ela confessasse os crimes mais abomináveis – para você ver como me sinto reconciliado com toda a espécie humana. Porém ela continuou fumando em silêncio, e eu continuei parado, com um pé dentro do quarto, aguardando sei lá o quê. Então a mulher baixou o cigarro e olhou para mim: O senhor me faz um favor? Claro, qualquer coisa que a senhora me pedir, quer dizer, desde que esteja dentro das minhas possibilidades – o que também não era dizer muita coisa, mas isso não cheguei a acrescentar. E com essas palavras dei mais um passo para dentro do quarto. E a mulher fez então seu pedido: Quando estiver com ela, diz pra ela que não precisa nunca mais vir aqui. Não precisa vir, telefonar, nada. Nunca mais. E essa encomenda que ela deu pro senhor me entregar, diz a ela, diga a ela que não posso aceitar, não vou aceitar, de jeito nenhum. E tirou mais uma baforada do cigarro, me encarando, claramente me desafiando, como quem diz: Quero ver você me fazer aceitar essa encomenda. Pode tentar, vamos.
Pois bem, eu tinha cruzado o maciço da Tijuca, trafegando em alta velocidade alguns metros abaixo da superfície da Terra, carregando a tal encomenda, e agora aquela criatura, entre uma e outra baforada, me dizia que não podia aceitá-la. Como você há de entender, essas palavras dela tinham para mim um sentido muito sério. Era como se ela me dissesse que tudo que eu tinha feito desde a véspera, desde o momento em que aceitei segurar a sacola da mulher nº 1 no metrô até aquele exato instante, tudo aquilo tinha sido completamente inútil, um desperdício de tempo, de energia, de vida, que afinal de contas ninguém é imortal – o tempo que a gente passa em filas erradas, assistindo a filmes ruins, ajudando pessoas que depois sacaneiam a gente, enfim, essas coisas todas representam um desperdício de vida, em última análise, é ou não é? Já lhe ocorreu que, se fossem colocados lado a lado todos esses momentos, todas essas horas, o tempo gasto à espera do eletricista que acabou não vindo, ou tentando se livrar de um operador de telemarketing, ou esperando um elevador que na verdade estava quebrado, ou conversando com a pessoa fascinante que acaba não tendo o menor interesse pela gente, ou mesmo convivendo anos com… mas chega de exemplos: que se todas essas extensões de tempo na vida de uma pessoa de, digamos, 57 anos de idade, fossem alinhados, teríamos talvez cinco ou seis anos corridos de absoluto desperdício, tempo mais que suficiente para que Goethe escrevesse uma dúzia de obras imortais, ou que Napoleão despachasse 10 mil pessoas desta para melhor? Já pensou nisso? Pois se não pensou, pense.
Mas retomando o fio da meada: eu precisava fazer alguma coisa, dar um jeito de justificar aquela minha viagem, aquela minha missão – sim, missão, se você me permite um toque de melodrama, porque de certo modo era mesmo uma missão, ditada por meu sentimento de honra, minha boa consciência de cidadão, ou consciência de bom cidadão, tanto faz. Minha senhora, comecei, a senhora precisa entender que para mim é da maior importância cumprir essa minha tarefa, qual seja, a de lhe entregar essa encomenda. Sou um homem sério. Quando me proponho a fazer algo, me sinto obrigado a fazer o que resolvi fazer. Quais sejam suas relações com a pessoa que deixou comigo essas caixas, isso não é da minha conta; tampouco me interessa o motivo que leva a senhora a não querer aceitar receber essas caixas. Do mesmo modo, não me importa o que a senhora resolva fazer com elas depois que eu sair desta casa, isso não cabe a mim decidir, a casa é sua, a encomenda também é sua, mas –
Nesse ponto ela me interrompeu: O senhor me desculpe, me desculpe se eu parecer grosseira por dizer o que eu vou dizer, mas a encomenda não é minha, se o senhor diz o que diz é porque o senhor não faz a menor ideia do que está acontecendo, não faz ideia. Porque se fizesse, ah, o senhor não seria capaz de dizer o que o senhor está dizendo, não seria capaz nem de pensar uma coisa dessas. O senhor não imagina a vida que eu levo, o que foi minha vida nesses últimos anos! O senhor sabe o que é ficar o tempo todo querendo largar tudo e tendo a certeza absoluta que não vai largar nada, nunca? Sabe o que é viver se agarrando com unhas e dentes a uma coisa que no fundo a gente não quer, que aliás é justamente o que a gente não quer, que a gente devia estar fugindo dela que nem o diabo da cruz? O senhor sabe o que é estar até aqui de coisas que nem a gente sabe direito o que é – quer dizer, saber a gente até sabe, o senhor entende, não é? O senhor entende muito bem, vai dizer que não, vai dizer pra mim que não! – e aí a gente vira pro lado e vê que a única pessoa com quem a gente pode falar é uma pessoa que…? E nesse ponto a mulher nº 4 sacudiu a cabeça, como se não conseguisse encontrar as palavras, ou então como se, depois de conseguir, se recusasse a usar as palavras que tinha encontrado. Quer dizer, ela continuou, eu sei que ela não tem culpa de ser como ela é, dizem que bem-aventurados os pobres de espírito porque deles é o reino dos céus, pode até ser, por mim tanto faz quanto tanto fez, mas e as pessoas que têm que aturar os pobres de espírito, hein? O que é que sobra pra elas, hein? O senhor me diga, por favor. Pois bem, eu, levando essa vida que eu levo, que é a única vida que eu conheço há sei lá quantos anos, e nem interessa quantos anos são, não interessa nem a mim, imagina o senhor, então! Pois bem, no meio disso tudo me vem a outra, essa… essa sirigaita, me mandar… me… me tratar como se eu fosse a empregadinha dela? Com que direito, eu lhe pergunto? Com que direito? Hein?
Aproveitei aquela pausa para arriscar: Dona Maricleide…
Mas ela não me deixou concluir a frase. E o senhor acha que eu não sei quem está por trás disso? Acha que eu não sei? Pois fique sabendo, pode dizer pra ela, que aqui ninguém é besta não, ouviu? Ó! E nesse momento repuxou a pálpebra inferior do olho direito, um gesto que teve um efeito perturbador, levando-se em conta que a aparência geral dela já era naturalmente assustadora. Cheguei a recuar um pouco, mas ao mesmo tempo não conseguia deixar de olhar para aquele olho de górgona, devidamente petrificado por ele. E a nº 4 insistia: Ela está pensando o quê? Toda metida, toda saltitante, crente que…! E de novo sacudiu a cabeça, de desprezo e abismamento.
Tentei imaginar a mulher nº 1, a do metrô, como uma sirigaita saltitante, e a imagem que resultou desse esforço foi tão incongruente que me alarmou; me dei conta de que estava muito perto da porta, de modo que, se acontecesse alguma coisa – mas o que poderia acontecer? –, não me seria difícil escapulir numa fração de segundo. E comecei outra vez: Dona Maricleide, eu…
E ela, numa espiral de veemência: Pois agora não vai ter mais conversa, não. Ela que mexa todos os pauzinhos dela, que eu mostro a ela com quantos pauzinhos se faz uma canoa, o senhor está entendendo? E ela que entre nessa canoa e vá nessa canoa pros quintos do inferno! Que vá à merda! Pode dizer isso pra aquela bisca! Tudo nesta vida tem limite, ouviu? Diz pra ela que tudo nesta vida tem limite, e que eu cheguei no meu limite! E de repente caiu no choro.
Aproveitando aquela oportunidade, com o pensamento não expresso de que eu também havia chegado ao meu limite, talvez com tanta razão quanto ela, se não mais, fui recuando até chegar à porta. Saí do quarto antes que ela parasse de chorar e voltasse a falar pelas tripas do Judas, ou então assoasse o nariz, duas possibilidades que, ao menos naquele momento, me pareceram igualmente abomináveis. Voltei para a sala, onde me deparei com a Mariinha, repimpada no mesmo sofá onde antes eu havia chegado a cochilar um pouco. Ela levou um susto ao me ver; na mesma hora levantou-se, com um certo esforço, e me entregou a sacola, tentando disfarçar o fato óbvio de que, aproveitando-se da minha ausência, estivera mexendo nela. Não, obrigado, não é minha, já estou indo, fui dizendo, enquanto recuava em direção à porta; a Mariinha insistiu e me estendeu a sacola de novo, balbuciando alguma coisa que não consegui entender, se é que era mesmo o caso de entender, mas fui mais rápido que ela, abri a porta e saí, sem fechar a porta nem olhar para trás. Atravessei o pátio com passos rápidos, sabendo que estava sendo seguido, e ainda não havia chegado ao arco que dava para a rua quando uma mãozinha gorda e úmida agarrou meu punho direito e me deteve; e antes mesmo que eu tivesse tempo de olhar para trás ela me enfiou na mão a alça da sacola, voltou correndo para dentro da casa e bateu a porta.
Fiquei um instante sem saber o que fazer; ouvi um carro passando numa transversal, com o rádio ligado bem alto; ouvi uma voz de criança ao longe chamando Miguel, Miguééôô; ouvi um cachorro latindo, duas, três vezes, mais longe ainda. Dei meia-volta, andei até o meio do pátio e larguei a sacola, encostando-a na mangueira estrangulada. Olhei para a casa fechada; estava em silêncio. Quando finalmente me vi na rua, pela última vez olhei para trás e vi que a sacola abandonada estava um pouco torta. Pensei em voltar para apoiá-la com mais aprumo no tronco da mangueira, como uma espécie de arremate final naquela minha tarefa cumprida, pois no final das contas eu havia – isso decidi naquele momento, uma decisão irrevogável, se você me permite mais um clichê –, eu havia cumprido a minha missão. Mas desisti ao sentir um pingo grosso cair no meu braço; olhei para cima e percebi que ia começar a chover, a chover pesado. As caixas de papelão iam ficar encharcadas, e no envelope, que antes jazia no fundo da sacola mas agora estava por cima de tudo, o nome de Maricleide Simas, que parecia ter sido escrito com hidrográfica azul, ia se apagar. E eu ia chegar molhado no metrô, e teria que viajar com as roupas empapadas até o final da linha. Tudo isso por ter levado às últimas consequências minhas obrigações cívicas, tudo isso para não agir como um insensível, um ser autocentrado, um monstro de egotismo. É, a culpa é mesmo sua, sim, não adianta fingir que não é. A culpa é toda sua.
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