Brasil Paralelo suspende estreia de primeiro longa de ficção
Produtora divulgou lançamento de filme baseado em best-seller sem ter seus direitos – até que a dona da obra foi informada da adaptação
A produtora Brasil Paralelo adiou, por tempo indeterminado, a estreia de seu primeiro longa-metragem de ficção, Oficina do Diabo. A empresa, uma plataforma digital rica em conteúdos negacionistas e conspiratórios, havia marcado para o dia 5 de outubro o lançamento, em cinemas de diferentes cidades do Brasil, e vinha anunciando com destaque que o filme é baseado no livro Cartas de um Diabo a seu Aprendiz, best-seller do escritor C. S. Lewis, o mesmo de As Crônicas de Nárnia.
Há três semanas, a piauí revelou que a produtora vinha apagando as referências do livro de seu material de divulgação depois que os donos dos direitos descobriram a adaptação não autorizada. Apagou posts e mudou a comunicação sobre o longa em seu site.
Procurada pela reportagem, a distribuidora Paris Filmes informou que o filme “saiu do calendário” e está “sem previsão” de lançamento. A Brasil Paralelo não se manifestou.
Mesmo sem ter acertado os direitos autorais com a The CS Lewis Company, empresa sediada na Inglaterra e responsável por administrar o espólio do autor, a Brasil Paralelo fez uma pré-estreia em São Paulo no dia 11 de setembro. O evento contou com a presença de nomes do mundo religioso influentes nas redes sociais. Estiveram presentes os padres Ricardo Marques (55,8 mil seguidores no Instagram) e Jorge Luís (353 mil seguidores) e Frei Gilson, do canal Som do Monte (3,2 milhões de seguidores). O ator Roberto Mallet, protagonista do longa (que também conta com Elisângela e Felipe Folgosi no elenco), também apareceu. Todos eles postaram em suas redes imagens do evento. O perfil oficial da Brasil Paralelo no Instagram não postou nada no feed sobre a pré-estreia do filme inspirado no livro de C. S. Lewis.
O filme Oficina do Diabo vinha sendo tratado por Henrique Viana, CEO e cofundador da Brasil Paralelo, como um marco na história da empresa. Toda a estratégia de marketing estava ancorada no fato de o filme ser baseado no livro do escritor que tem muito apelo entre o público cristão. A Brasil Paralelo divulgou material de divulgação afirmando se tratar de uma adaptação, assim como Viana falava do assunto abertamente. Em sua conta do Instagram, em que soma 2,7 milhões de seguidores, a Brasil Paralelo publicou: “Baseado em Cartas de um Diabo a seu Aprendiz, de C. S. Lewis, autor de As Crônicas de Nárnia, #OficinaDoDiabo estreia em breve somente nos cinemas.”
Tudo mudou no final de julho, quando uma empresa brasileira de audiovisual entrou em contato com a The CS Lewis Company Ltd., que negou ter sido contatada pela Brasil Paralelo. Iniciou-se, então, uma operação abafa. A produtora negacionista começou a deletar de suas redes qualquer menção aos termos “baseado” e “inspirado”. Quando foi questionada pela piauí no dia 17 de agosto sobre os direitos autorais, a Brasil Paralelo publicou em suas redes uma postagem dizendo que Oficina do Diabo foi inspirado em oito livros, entre eles Cartas de um Diabo a seu Aprendiz, de C. S. Lewis. São eles: O Anticristo, de Friedrich Nietzsche; O Homem Eterno, de G. K. Chesterton; Sermões, do Padre Antônio Vieira; A Vocação Religiosa, de Santo Afonso Maria de Ligório; Parerga e Paralipomena, de Arthur Schopenhauer; Noite Escura da Alma, São João da Cruz; e, por fim, a Bíblia. As obras parecem terem sido escolhidas a dedo. Todas elas foram escritas por autores que morreram há mais de setenta anos. Ou bem mais. São Paulo, o apóstolo que escreveu algumas das epístolas do Novo Testamento, morreu há quase 2 mil anos.
Um livro só se torna domínio público após setenta anos da morte de seu autor. Faltam dez anos para a obra de C.S. Lewis chegar lá: ele morreu no dia 22 de novembro de 1963, em sua casa, em Oxford, vítima de um ataque cardíaco.
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