FOTO: WIKIMEDIA COMMONS
As delações sobem a rampa
Delatar foi ficando cada vez mais caro. Hoje, só entra para o rol de colaboradores da Lava Jato quem expuser entranhas ainda mais sórdidas do petrolão
A delação premiada dos executivos da Andrade Gutierrez, que teve trechos divulgados ontem, espanta não apenas pela quantidade de detalhes, pelos personagens envolvidos ou pelo calibre dos crimes que a cúpula da segunda maior empreiteira do país confessa – afinal, propina de 150 milhões de reais em uma única obra é de espantar até mesmo quem já se anestesiou diante das cifras bilionárias do petrolão. A delação da Andrade impressiona, principalmente, por que ela indica a enormidade do que ainda vem por aí.
Quem acompanha a Operação Lava Jato desde o início sabe que, quanto mais o suspeito demora em colaborar com as investigações, mais detalhes do esquema têm de entregar para escapar da prisão e reduzir a pena. As primeiras delações saíram barato. Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef até citaram alguns peixes graúdos, como Sérgio Cabral, mas não tiveram de entrar em pormenores sobre ilícitos de campanha para obter um acordo com o Ministério Público, há dois anos. Desde então, 47 novas delações foram sacramentadas. Aos poucos, a investigação escalou a hierarquia política e empresarial da corrupção, atingindo deputados, senadores, ex-ministros, ministros, o ex-presidente Lula – e, mais recentemente, figuras bastante próximas da presidente Dilma Rousseff, como a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. Delatar foi ficando cada vez mais caro. Hoje, só entra para o rol de colaboradores da Lava Jato quem envolver escalões cada vez mais altos ou expuser entranhas ainda mais sórdidas do petrolão.
O roteiro, portanto, está dado. A julgar pelo andar das negociações em curso em Curitiba, os próximos capítulos serão protagonizados pelo empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, pelo marqueteiro João Santana e pelos executivos da Odebrecht – nessa ordem. Léo Pinheiro promete entregar gente de variados partidos, mas já entendeu que não conseguirá acordo sem esmiuçar o que há de fato na acusação de que sua empresa deu um triplex à família Lula da Silva e apartamentos a mais um grupo de petistas. João Santana, por sua vez, passou as últimas semanas tentando convencer os investigadores a aceitar que sua mulher, Mônica, falasse em nome do casal. Fracassou, e já começa a indicar que vai abrir o que sabe sobre os esquemas clandestinos de financiamento das campanhas petistas de que participou. Já a Odebrecht…
Para a Lava Jato, a Odebrecht é a joia da coroa, o troféu de final de campeonato. Enquanto Marcelo Odebrecht e outros executivos do grupo resistem na cadeia, uma secretária já contou o que sabia e o diretor-presidente da construtora, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, caminha a passos largos para um acordo. Com a Odebrecht, as negociações ainda seguem entre avanços e recuos, num xadrez em que a República de Curitiba tem franca vantagem. “A Odebrecht não tem saída”, me disse uma pessoa enfronhada nas conversas. “A quantidade de provas já é suficiente para acabar com a companhia.” Quanto mais o tempo passa, mais alto fica o preço a ser pago no leilão das delações. É possível que daqui a pouco nos sintamos ingênuos por termos reagido com espanto às revelações da Andrade Gutierrez.
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