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    Políticos de oposição e sindicalistas postados nas galerias protestaram vestidos com jaquetas laranja – a cor do uniforme da Petrobras – contra a aprovação do projeto FOTO: Antonio Augusto / Câmara dos Deputados

questões da política

Corrida contra o tempo no pré-sal

Consuelo Dieguez | 06 out 2016_20h30
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A descoberta de óleo na camada do pré-sal, em meados de 2007, foi saudada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva: o Brasil enfim passaria a ser um dos maiores produtores de petróleo do mundo. Quase dez anos depois, a perspectiva não se confirmou. Não pela falta de combustível, mas pelo excesso de interferência estatal. Empolgado com a grandeza da descoberta, o governo Lula decidiu mudar a lei do petróleo criada após a quebra do monopólio da Petrobras, no final dos anos 90, para que o Estado tivesse a garantia de que toda aquela riqueza fosse explorada preferencialmente pela estatal brasileira. A intenção pode ter sido boa, mas o resultado foi um desastre.

Com a nova lei, a Petrobras viu-se obrigada a explorar pelo menos 30% de todos os campos de petróleo e a atuar como operadora de todos eles. Assim, o governo acabou engessando a produção do combustível no Brasil, numa época em que o barril de petróleo ultrapassava a casa dos 100 dólares no mercado internacional. A estatal simplesmente não tinha recursos para investir em tantas áreas ao mesmo tempo, tampouco disposição para se associar a outras petroleiras.

Além disso, com a mudança da lei para as áreas do pré-sal, os estados não produtores de petróleo começaram a reivindicar o direito a uma parcela dos royalties pagos pelas descobertas futuras. A briga foi parar no Congresso e todos os leilões de campos de exploração – dentro e fora do pré-sal – foram suspensos.

De lá para cá, tudo piorou sensivelmente. A Petrobras, assaltada por um esquema de corrupção que quase a levou à bancarrota, perdeu capacidade de investimento. A isso se juntou outro fator que lhe tirou ainda mais fôlego: o preço do barril de petróleo despencou da casa dos 100 dólares para 40 dólares.

No dia 5 de outubro, a Câmara dos Deputados aprovou, por 292 votos a favor e 101 contra, projeto de lei que retira da Petrobras a obrigação de ter participação de 30% nos campos do pré-sal. Estabeleceu, contudo, que a estatal terá direito a escolher os campos onde atuará. Para a Petrobras, foi um alívio: ela se livrou das amarras de ser compelida a investir onde não queria, dado que não teria recursos nem interesse em estar em todos os negócios. Para o Estado, a medida também foi positiva, pois a antiga lei condicionava a exploração de petróleo no país à capacidade operacional da Petrobras. Sem a estatal no jogo, nenhuma outra petroleira que quisesse investir no Brasil poderia fazê-lo. Mesmo diante dessa evidência, políticos de oposição e sindicalistas postados nas galerias protestaram vestidos com jaquetas laranja – a cor do uniforme da Petrobras – contra a aprovação do projeto.

A decisão da Câmara, no entanto, não pôs  fim à polêmica. Alguns deputados pretendem apresentar emendas ao projeto – se alterado, ele terá de ser votado no Senado. E se isso acontecer, ainda vai demorar um bom tempo para a aprovação definitiva da lei, o que provavelmente ocorrerá só depois do governo Temer. Por essa razão, o governo está disposto a vetar todas as emendas e aprovar rapidamente a lei, a fim de que os investidores estrangeiros já possam participar dos leilões do pré-sal no ano que vem. Com isso, o governo federal espera que a arrecadação com os royalties do petróleo aumente significativamente. Para a União e os estados produtores, quanto mais rápida a entrada desses recursos, mais fácil a recuperação de suas finanças. “Todos ganham com o novo projeto”, avaliou Adriano Pires, especialista na área de energia. “O país já perdeu quase uma década na exploração do petróleo pelo fato de a Petrobras estar engessada à lei que a obrigava a ter uma participação de 30% em todos os campos.”

O problema é que os gestores públicos, com os caixas de estados e municípios quebrados, resolveram buscar recursos no setor em que acreditam haver dinheiro de sobra: o petróleo. O estado do Rio é o mais voraz. Com suas finanças em frangalhos, o estado resolveu questionar na Justiça o percentual de royalties que têm a receber. A petroleira não estaria transferindo o valor correto, uma vez que o cálculo se baseia sobre um preço mínimo menor do que o praticado no mercado internacional. A estatal refuta a acusação. O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal. O relator da denúncia é o ministro Luiz Fux, do Rio de Janeiro, muito ligado aos políticos do estado. A primeira rodada de negociação entre a Petrobras e o governo do estado deu em nada. O ministro mandou que se entendessem antes de ele julgar o caso.

Se o estado ganhar a causa, a Petrobras, que também tenta desesperadamente equilibrar suas finanças, sofrerá novo golpe, tendo que desembolsar mais dinheiro para o estado do Rio. Não só ela: as outras petroleiras terão que refazer as contas. Isso pode desanimar ainda mais os investidores estrangeiros, cansados de tantas mudanças no marco regulatório, que aumentam a incerteza de seus investimentos. “É preciso ficar claro o que se quer para o país”, afirma Pires. “Aumentar os investimentos em petróleo ou salvar a economia do Rio de Janeiro?” Caso se decida pelo aumento dos repasses ao estado, é possível que o país esteja matando, mais uma vez, a galinha dos ovos de ouro.

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