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    Lula com Janones, aliado fundamental na estratégia de redes. "Eu cheguei agora e, como dizem, estou na janelinha", diz o deputado mineiro. CRÉDITO: FOTOARENA/FOLHAPRESS

questões políticas

O inflamável

André Janones conta como foi convencido a desistir da candidatura à Presidência por Lula, de quem se tornou um aguerrido cabo eleitoral

João Batista Jr. | 28 set 2022_10h34
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Enquanto almoçava feijão tropeiro, arroz branco, cupim bovino, vinagrete e salada de palmito na Churrascaria Assis, a mais tradicional da cidade de Ituiutaba, no Triângulo Mineiro, André Janones recebeu pelo WhatsApp a cópia de um texto que seria postado em suas redes sociais. Seu sorriso foi se abrindo à medida que lia a mensagem. Antes de chegar ao restaurante, o deputado federal, candidato à reeleição pelo Avante, havia tido a ideia de capitalizar na internet o fato de Jair Bolsonaro ter se autoqualificado de “imbrochável”. Pediu, então, que um assessor escrevesse uma simulação de cláusula de ação judicial movida pelo presidente, que dizia: 

Janones vem tratando com total desrespeito, debochando, humilhando, menosprezando o Presidente da República. Os ataques de André Janones encorajam outras pessoas a fazerem chacota com o presidente nas redes e nas ruas, como o episódio em que foi chamado de “tchutchuca do Centrão” por um youtuber.

Enquanto saboreava o prato de comida, ele fez o título da mensagem: “O imbrochável brochou.” O post teve mais de 1.300 compartilhamentos e 2 mil comentários. Naquele mesmo dia 8 de setembro, quinta-feira, Janones havia sido bloqueado no Twitter pelo perfil do presidente. Ele publicou na rede o aviso de bloqueio e colocou como legenda cinco emojis derramando lágrimas. A publicação teve 31 mil curtidas e 2.800 comentários. 

Três dias antes, Bolsonaro havia entrado com um processo judicial pedindo que Janones removesse postagens que o atacavam. Na petição, o presidente usou argumentos como “A liberdade de expressão não contempla a informação falsa ou mentira chapada”. A cláusula imaginária da postagem de Janones no dia 8, porém, não consta do processo. 

O bloqueio no Twitter pelo perfil de Bolsonaro não era novidade para o deputado. Já tinha ocorrido em 2021, quando Janones, escrevendo sobre a morte do comediante Paulo Gustavo, dirigiu-se ao presidente: “Que Deus em sua infinita misericórdia consiga te perdoar, dificilmente nós aqui na terra vamos.” Ele estava se referindo à relutância de Bolsonaro em comprar vacinas anti-Covid. Paulo Gustavo morreu aos 42 anos, vítima do novo coronavírus, em 4 de maio de 2021, antes que pudesse se vacinar.

Perto do final da refeição na Churrascaria Assis e depois de bebericar seu quarto copo de Coca Zero, Janones correu o olho pelo celular e algo lhe chamou a atenção. “É isso! Achei o tema para fazer uma live no Facebook”, disse. O candidato a vice-presidente Geraldo Alckmin havia tuitado sobre o corte de recursos do Farmácia Popular, que fornece remédios gratuitamente para mais de 21 milhões de pessoas, depois que Bolsonaro havia decidido cortar 59% do orçamento de 2023 do programa a fim de garantir mais recursos para o orçamento secreto. 

Desde o começo da pandemia, Janones se tornou um grande incentivador do pagamento de benefícios sociais. Ao todo, realizou 488 postagens tendo como título “Auxílio Emergencial”. Juntas, até meados de setembro, elas tinham no Facebook 2,4 bilhões de visualizações, 31 milhões de compartilhamentos, 21,4 milhões de comentários e 135 milhões de curtidas ou reações. “Ao contrário do Twitter, em que o algoritmo privilegia muitas postagens em um mesmo dia, o Facebook entrega de forma diferente. Tem de usar com parcimônia. Por isso fico dias sem postar, para que, quando eu veicular algo na minha timeline, o efeito seja de uma bomba de longa duração”, explica o deputado, que tem 7,9 milhões de seguidores no Facebook.

Ele decidiu lançar a “bomba” sobre a Farmácia Popular às 17h30. Deixou o restaurante e foi para o seu comitê de campanha em Ituiutaba, sua cidade natal. A casa onde fica o comitê, em uma das ruas comerciais mais movimentadas do município, tem na fachada um adesivo de cerca de 2 metros do rosto do deputado, mostrando seu sorriso alvíssimo, obtido graças às lentes de porcelana aplicadas nos dentes. 

Ao chegar, Janones instalou um microfone em seu iPhone 13 e se preparou para gravar. De camisa branca, calça jeans e pés descalços, fez uma pequena oração antes de apertar o play. O homem de voz serena e tranquila então se transfigurou diante da tela do celular. Em tom de revolta, ele gritou e gesticulou freneticamente com a mão esquerda – enquanto na outra mão segurava seu míssil, o celular:

 Pessoal, atenção. Aqui é o deputado federal André Janones falando ao vivo para todo o Brasil. Eu peço que compartilhem para o país todo o que eu vou falar agora porque ainda dá tempo para tentar impedir. Você que sofre com asma, hipertensão… O governo federal, a Presidência da República, nesse momento acaba de cortar o medicamento de vocês. Acabou o remédio para o povo, acabou o medicamento para os mais pobres. Acabou. […] Você que precisa da Farmácia Popular, atenção: o presidente cortou 60% do dinheiro, do seu dinheiro, dos seus impostos. Não era ele quem pagava, era você. O presidente cortou esse recurso para o ano que vem […]. Isso quer dizer que você que tá me assistindo agora não vai ter seu remédio de graça. Isso é desesperador.

Quando terminou a live, Janones, de 38 anos, estava ofegante. Por causa da mudança abrupta de atitude, de pessoa pacata a político raivoso, perguntei se ele não moldou um personagem para agradar os algoritmos do mundo digital. “Sabe que já me fiz essa pergunta? A resposta é não. A minha revolta é genuína.” A transmissão durou apenas 2 minutos e 20 segundos. Um minuto depois, a live estava disponível como vídeo e registrava 7 mil compartilhamentos e 4,8 mil curtidas; três horas depois, havia sido compartilhada 42,5 mil vezes e recebido 33,2 mil curtidas. A bomba teve o impacto desejado. 

Todas as três postagens – a simulação de cláusula processual, a resposta ao bloqueio feito pelo perfil do presidente e a live inflamada – foram ideias de Janones. Ele não comunicou à equipe de campanha de Lula antes de levar adiante as iniciativas. O deputado federal, que abriu mão de sua candidatura à Presidência para apoiar o petista, tem carta branca para publicar o que bem quiser em suas redes pessoais, até porque não dispõe de nenhum acesso às redes sociais oficiais de Lula. 

Mas há também postagens encomendadas. O comitê de campanha de Lula estava preocupado com impacto do início do pagamento do Auxílio Brasil, cuja primeira parcela cairia nas contas dos beneficiários a partir do dia 9 de agosto. Ainda que necessário em um país onde 33 milhões de habitantes passam fome, o programa teve evidente objetivo eleitoreiro. Atendendo ao pedido do comitê, no mesmo dia 9, Janones fez um post sobre o assunto: escreveu no Facebook que havia recebido um documento que comprovava uma “covardia”. Atiçou a curiosidade de seus seguidores sem revelar maiores detalhes. No dia seguinte, fez uma live no Facebook, em que dizia: 

Ontem começou a ser pago o Auxílio Brasil no valor de 600 reais. Estou aqui com as leis nas mãos. O Auxílio Emergencial acaba em dezembro. Ele acaba em dezembro, a partir de 1º de janeiro não tem mais nada. Eu tive acesso com exclusividade. O programa de governo de Bolsonaro [para um eventual segundo mandato] diz que essa é uma das prioridades, que vai ser lutar pelo auxílio em 600 reais, e só. Ele nem garante que vai conseguir. Repassem essa informação em todos os grupos que vocês fazem parte, nos grupos de compra e venda da sua cidade, nos grupos de notícias da sua cidade. 

A live teve mais de 137 mil comentários e 243 mil curtidas. A estratégia de Janones para frear o possível impacto da ação eleitoreira de Bolsonaro era falar que o programa acabaria no final do ano. (Embora tenha dito que pagará 600 reais de Auxílio Brasil no ano que vem, caso reeleito, Bolsonaro apresentou em sua proposta de orçamento para 2023 o valor de 405 reais para o mesmo programa social.) No dia 10 de agosto, o perfil de Lula no Twitter fez a seguinte publicação:

Ontem começou a distribuição do auxílio emergencial até dezembro, medida defendida pelo PT desde 2020, feita pelo governo atual na véspera da eleição. O @AndreJanonesADV fez há pouco uma live de alerta sobre o tema em seu Facebook. Vejam lá #EquipeLula.

Janones defende sua estratégia. “Eu não menti. O Auxílio Emergencial, criado durante a pandemia por pressão do Congresso, acaba neste ano de fato.” Pergunto se ele não induz seus seguidores a acreditar que nada será pago no ano que vem, na hipótese da reeleição de Bolsonaro. “Sou advogado e sei exatamente o que estou fazendo, não tem mentira na minha frase”, ele responde.

Outra demanda feita a Janones veio do grupo Vamos Juntos, reunido no WhatsApp, do qual fazem parte, além do deputado, pessoas do comitê da campanha de Lula: o marqueteiro Sidônio Palmeira, os coordenadores de comunicação Rui Falcão e Edinho Silva e o diretor de criação Raul Rabelo, entre outros. Estavam todos preocupados com a fake news espalhada pelas redes bolsonaristas de que Lula fecharia igrejas evangélicas caso eleito, como o deputado Eduardo Bolsonaro postou no Twitter, Instagram e Facebook, em 19 de agosto: “Lula e PT apoiam invasões de igrejas e perseguição de cristãos.” Na primeira semana de setembro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou que Eduardo deletasse essa postagem de suas redes. “O que se tem é mensagem ofensiva à honra e imagem de pré-candidato à Presidência da República, com divulgação de informação sabidamente inverídica”, afirmou em sua decisão a ministra Cármen Lúcia.

Ligado à Igreja Batista da Lagoinha, Janones é contrário a desmentir fake news enquanto ela esteja sendo disseminada, não importa a gravidade. “Não se desmente por uma simples razão: evitar alimentar o algoritmo e, portanto, dar ainda mais tração ao assunto”, diz ele. “Se Lula desmente que não irá fechar igreja, o algoritmo vai entregar absolutamente tudo relacionado ao tema. Então quando alguém for pesquisar sobre o caso, terá acesso inclusive à mentira.”

Para estancar a fake news do fechamento das igrejas, ele optou por voltar ao tema de que Bolsonaro, se reeleito, iria acabar com o Auxílio Emergencial. “Sabe o que aconteceu? O Bolsonaro precisou ir ao programa eleitoral gratuito na tevê e na rádio explicar que não iria acabar com o auxílio, e então a lorota de que o PT iria fechar igrejas perdeu força.”

André Janones fotografa Lula em almoço na casa de Luís Tibé, presidente nacional do Avante Belo Horizonte — Crédito: Acervo pessoal de Janones

 

O marqueteiro de Lula, Sidônio Palmeira, reconhece que Janones mudou a narrativa das redes nos dois casos. “Ele é rápido em desmentir mentiras, em mudar o foco de uma história para outra. Tem feito um trabalho essencial na campanha, sem fazer parte da equipe de marketing. Ele posta o que quiser, pois usa suas próprias redes e não a do presidente Lula”, diz Palmeira, por telefone. O marqueteiro lembra que Janones se elegeu graças às redes sociais. Na eleição de 2018, tinha 1 milhão de seguidores no Facebook, sendo 200 mil deles moradores de Minas Gerais. O resultado nas urnas: foi o terceiro mais votado no estado, com 178.660 votos. “Quer cartão de visitas melhor que esse?”, pergunta Palmeira. 

Apesar de tais predicados, há tropeços ao longo do caminho. Na primeira semana de agosto, Janones atribuiu a Bolsonaro a suspensão do piso salarial de profissionais da enfermagem. O veto ao piso foi uma ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), e o TSE determinou que o deputado deletasse a postagem. “Não considero a minha ação ruim porque informei se tratar de fake news, não induzindo o seguidor ao erro. Mas, de todo modo, pensando melhor, eu não faria esse tipo de postagem de novo.”

Janones decidiu usar a mesma estratégia digital de Bolsonaro: despertar emoções para causar engajamento e repercussão. Em sua avaliação, o algoritmo do Twitter, por exemplo, tem privilegiado mensagens que expressam brigas, polêmicas e citações de nomes de adversários. “No passado, as pessoas foram exiladas por criticar a ditadura, agora me vem gente da geração Nutella dizer estar horrorizada porque xingo o Bolsonaro”, diz Janones. Ele costuma se referir a Carlos Bolsonaro como “miliciano de merda” e “seu bosta”. Para Eduardo Bolsonaro, os tratamentos dispensados são “bananinha da milícia” e “verme”. O deputado também relaciona toda a família Bolsonaro à morte da vereadora carioca Marielle Franco, cujo assassinato em 2018 não foi esclarecido até hoje. “O bananinha da milícia não prega tanto a liberdade de expressão? Estou exercendo a minha”, diz Janones 

Se no Twitter ele mostra sua ousadia bélica e seu gosto pelo baixo calão, no Facebook a estratégia é outra. Nas lives, solta suas bombas. Em grupos de compra e venda e de brechós, lança mísseis direcionados. Diversas cidades do interior têm grupos como Compra e Venda Uberlândia (166 mil membros), Enjoei Tô Vendendo Uberaba (74 mil membros) e Compra e Venda Ituiutaba (60 mil membros). Ao contrário do WhatsApp, em que cada grupo pode ter até 256 integrantes, as comunidades do Facebook não têm restrição quanto ao número de usuários. Elas passam ao largo do radar das consultorias de dados, que pesquisam apenas as citações que constam da timeline da página dos usuários, e não as que aparecem nas páginas dos grupos. “Eu posto mensagens todos os dias em dezenas, as vezes centenas, de grupos falando sobre como o Lula olha para o social e como o Bolsonaro não tá nem aí para os pobres”, diz Janones. “Muitas vezes os usuários dos grupos pegam esse conteúdo para abastecer as conversas com amigos e parentes em grupos de WhatsApp.” 

André Janones e Lula na reunião com dirigentes dos partidos que integram a Coligação Brasil da Esperança, em São Paulo (SP), no início de setembro — Foto: Victor Masson/Acervo pessoal de André Janones

De acordo com a Palver, empresa de engenharia e análise de dados que assinou um acordo de cooperação com o TSE para enfrentar a desinformação durante as eleições, Janones, sozinho, supera Flávio, Carlos e Eduardo Bolsonaro, somados, em número de citações em grupos de WhatsApp, na grande maioria dos dias do período analisado. A empresa monitora 15 mil grupos de WhatsApp por dia, em um total de quase 800 mil de usuários. 

No dia 9 de setembro, a cada 200 mil mensagens, Janones foi citado 52 vezes, enquanto os três filhos de Bolsonaro tiveram desempenho muito menor: Flávio e Eduardo, 7 citações, cada; Carlos, 3 citações. No dia 13 de setembro, o deputado mineiro foi citado 106 vezes, ao passo que Flávio, Eduardo e Carlos não passaram de 5, 5 e 3 citações, respectivamente. O ápice da repercussão nos grupos de WhastApp foi no dia seguinte ao debate presidencial na Band, em 28 de agosto, quando ele discutiu com Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente: o deputado teve 312 citações, sempre a cada 200 mil mensagens.

Somando Facebook, Twitter, Instagram e YouTube, Janones tem 11,7 milhões de seguidores. É mais que Eduardo (10,6 mi), Flávio (7,9 mi) e Carlos Bolsonaro (6,7 mi). De acordo com a consultoria de análise de dados Bites, dos 15 posts de Janones com mais interações no Facebook, 14 são sobre o Auxílio Emergencial. O primeiro é sobre o apoio à greve dos caminhoneiros, de maio de 2018. “No Instagram, o post com mais interações foi aquele em que, ao lado de Lula, ele declarou: ‘Agora somos um só.’ Teve 154,3 mil interações”, conta André Eler, diretor adjunto da Bites. 

A briga com Salles rendeu engajamento, e muitas críticas. A principal delas era que Janones poderia respingar sua belicosidade na imagem de Lula. O deputado foi ao debate na Band a convite de Gleisi Hoffmann. No mesmo dia do evento, a presidente do PT escreveu a ele, às 14 horas, dizendo que Lula “fazia questão” de sua presença. “Leio na imprensa que parte da cúpula do PT sente ciúme de mim, mas nada chegou até mim – até entendo se tiver”, afirma Janones. “Muita gente estava visitando Lula na prisão e nunca negou apoio quando ele estava condenado injustamente. Eu cheguei agora e, como dizem, estou na janelinha. Mas o fato é: na minha frente, está todo mundo bem comigo.”

Três dias após o debate, Aloizio Mercadante, ex-ministro-chefe da Casa Civil no governo Dilma e responsável pelo atual programa de governo de Lula, ligou para Janones para dizer que não havia nenhuma indisposição da parte do PT em relação ao episódio do debate, ao contrário do que diziam notas e matérias veiculadas na imprensa. “O Janones apoiou para valer e se engajou com muita determinação nas redes sociais”, diz Mercadante à piauí, por WhatsApp. “Ele conhece bem a linguagem e a lógica dos algoritmos para alavancar as mensagens para além das bolhas. Ele contribuiu muito e segue contribuindo, assumindo pessoalmente suas postagens e posições.”

A convite de Lula, Janones esteve ao lado do candidato presidencial em dois comícios. O primeiro foi em Belo Horizonte, no dia 18 de agosto, quando o deputado federal foi citado por Lula no palanque. Nos bastidores, circulou a informação de que Janones foi impedido de discursar por orientação de Alexandre Kalil (PSD), rival do governador Romeu Zema (Novo), que é apoiado pelo Avante em Minas. Mas Kalil refuta a explicação. “Isso é mentira, uma calúnia. Qualquer comício que o Janones quiser participar e falar, ele fala”, disse o ex-prefeito de Belo Horizonte.

Dois dias depois, em um comício em São Paulo, Janones fez um discurso inflamado a favor de Lula e foi aplaudido pela plateia no Vale do Anhangabaú. Ele levou ao evento sua equipe de marketing para fazer gravações que utilizaria em sua própria campanha à reeleição. Na ocasião, notou-se que Janones e Guilherme Boulos (Psol) não se cumprimentaram. Os dois também não se seguem nas redes sociais. 

Filho da empregada doméstica Divina Janones com José Antônio Janones, que fazia gaiolas para pássaros e era cadeirante, André Luis Gaspar Janones nasceu em 5 de maio de 1984, em um bairro de classe baixa na periferia de Ituiutaba. Ele mal conheceu o pai, que morreu de doença de Chagas quando o filho tinha apenas 10 meses de vida. Estudou sempre em colégio público. Começou a trabalhar cedo, como vendedor de sorvete, feito em uma máquina adquirida por seu padrasto, José Maria da Silva. 

Um dia, quando sua mãe passava reboco de cal na casa onde vivia com o marido e os dois filhos (e a família ainda vive, só que agora reformada), ela leu em um jornal que protegia o chão dos respingos sobre um cursinho pré-vestibular recém-inaugurado, destinado a jovens negros e pessoas carentes. Graças ao curso seu caçula conseguiu entrar na faculdade de direito de sua cidade e ainda obter uma bolsa de 75% dos custos da escola. Durante o curso, ele trabalhou como cobrador de ônibus, escrevente do Tribunal de Justiça e assessor parlamentar. Foi também secretário do PT municipal, depois de se filiar ao partido em 2003, quando tinha 19 anos (permaneceria na legenda até 2015).

No mesmo dia em que pegou a carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em junho de 2009, abriu uma pequena sala comercial e tirou a mãe do serviço de empregada para ser sua ajudante geral. Adquiriu ali o hábito de entrar com ações pro bono para pessoas carentes com problemas de saúde. Em geral, eram pedidos de liminar para obter autorização para adquirir remédio de forma gratuita ou antecipar uma cirurgia. 

Quando ele passou a publicar a respeito desses casos em seu perfil no Facebook, começou a ganhar certa projeção na cidade. O estilo histriônico dava seus primeiros sinais. Nas reuniões na Câmara de Vereadores, tratava os parlamentares pelos mesmos termos que usa para se referir à família Bolsonaro. “Cala boca, senta na sua cadeira, quem paga o seu salário sou eu”, já esbravejou para um presidente da Câmara de sua cidade. Toda essa valentia sempre foi filmada para ser postada nas redes, evidentemente. Janones também fazia lives na porta dos hospitais para denunciar a precariedade dos serviços, fazendo-se uma versão local do apresentador e deputado federal conservador Celso Russomanno (Republicanos-SP). 

Mas não foi a área da saúde que projetou o nome de André Janones nacionalmente. Em maio de 2018, ele recebeu uma mensagem via Facebook de um caminhoneiro, pedindo que abordasse em sua rede social a greve da categoria, que então preocupava o país. De início, Janones não se animou com a ideia. Mas, quando viu que a greve estava em todos os programas de tevê e nas redes sociais, decidiu fazer um vídeo a respeito. “Pedi para a minha sobrinha escolher a camisa que eu vestiria nesse vídeo”, recorda. “Algo me dizia que seria um divisor de águas em minha vida.” 

No vídeo, de camisa azul-marinho e barba aparada, Janones desce do carro com o celular na mão esbravejando seu apoio aos grevistas. “Eles estão defendendo o interesse de vocês. É por causa da alta da gasolina que aumenta o preço do arroz, o preço do feijão…”, disse. Até então, ele somava 50 mil seguidores no Facebook. Seis horas após a publicação, chegou a 100 mil seguidores. No dia seguinte, 200 mil. O vídeo de 3 minutos e 41 segundos feito em apoio aos grevistas foi visto mais de 15 milhões de vezes apenas em sua página da rede social, sem falar nos compartilhamentos e replicações, o seu recorde até hoje.

Janones sonhava havia algum tempo em se dedicar à política. O sucesso durante a greve o estimulou a se candidatar a deputado federal em 2018, pelo Avante, ao qual se filiou porque o partido lhe prometeu “não passar a rasteira, que de fato iria apoiar a minha candidatura”, como ele diz. No dia da eleição, ele somava 1 milhão de seguidores no Facebook. A campanha nas redes deu certo: o jovem advogado foi um dos sete deputados eleitos pelo Avante, legenda de centro, que apoiou Ciro Gomes no primeiro turno. 

O deputado se lembra de ter entrado em desespero nas eleições daquele ano, quando viu surgir o movimento Ele Não contra Bolsonaro. “O #EleNão teve o mesmo peso da facada”, avalia. “Sabe por quê? A pessoa pensa assim: ‘O país está quebrado e com milhões de desempregados, todo mundo pode ser presidente menos esse cara?’ Fica uma percepção de perseguição: ele passou a ser uma vítima. Sem falar na burrice de chamar a atenção para o cara. As pessoas que se sentem excluídas se identificaram logo com o Bolsonaro.”

Em Brasília, a atuação de Janones na Câmara era vista com desprezo por boa parte de seus colegas. “O Rodrigo Maia nem olhava na minha cara”, conta o deputado, sobre o ex-presidente da Câmara. Em 2019, ele decidiu criar um perfil no Facebook para a sua assessora parlamentar Leandra Guedes e passou a abastecer pessoalmente as redes sociais dela a fim de fazê-la prefeita de Ituiutaba. Deu certo. Ex-cabeleireira e formada em administração de empresas, a goiana Guedes foi eleita com 46,7% dos votos, também pelo Avante. “No começo, eu tinha medo de falar em público, mas aos poucos fui aprendendo com o André”, diz a prefeita, em seu gabinete no Centro da cidade. Embora não falem publicamente do assunto, Guedes e Janones formam um casal – entre idas e vindas – há dez anos. Um porta-retrato com a fotografia dos dois decora a bancada da sala da prefeita, o mesmo local onde ela costuma depositar sua bolsa Louis Vuitton. 

Uma vez eleita, Guedes seguiu os passos de seu mentor, tornando-se ativa nas redes sociais. Em Ituiutaba, circula que quem administra de fato a prefeitura seja o próprio André, como o deputado é conhecido em sua terra natal, de cerca de 110 mil habitantes. “A Leandra é técnica e me escuta muito, mas a decisão final é sempre dela”, diz ele. A prefeita também empregou duas assessoras parlamentares de Janones em cargos importantes na administração municipal. “Elas são de confiança da prefeita, não vejo problema com essas nomeações”, justifica. Os dois romperam com o vice-prefeito, Silvio Divino Vilarinho (Podemos), porque ele foi contra a orientação de fechar o comércio no auge da pandemia. Em Ituiutaba a economia é totalmente ligada à agropecuária e é comum ver carros com adesivos dos inimigos Bolsonaro e Janones, lado a lado. 

A parceria entre deputado e prefeita tem rendido frutos. Entre 2019 e 2022, Janones enviou 32,8 milhões de reais (já pagos) para municípios mineiros, sendo que 25,6 milhões (78% do total) foram destinados a Ituiutaba para setores como saúde, educação e serviço social. Uma emenda em especial causou polêmica. Janones destinou 1,9 milhão de reais para a realização da Expopec, uma feira agropecuária que aconteceu entre 15 e 25 de setembro. Entre outros gastos, os cachês de artistas como Gusttavo Lima, Zezé Di Camargo e Luciano e João Neto e Frederico foram pagos com essa verba. “Eu mandei dinheiro para essa festa, sim, e não me arrependo. Vou mandar para mais eventos. Pobre também tem direito a se divertir”, diz o deputado. Todos os shows foram gratuitos. Embora diga ser contrário ao orçamento secreto, ele destinou outro 1,5 milhão por meio desse recurso para ser usado no recapeamento de ruas de sua cidade. “Eu e Leandra fomos bater diretamente no gabinete do Rodrigo Pacheco, também mineiro”, conta, sobre o presidente do Senado. “Eu pedi o dinheiro, e ele falou que poderia enviar, então não questionei de onde viria.” 

Desde que assumiu o mandato como deputado federal, Janones tem cuidado de fazer uma recauchutagem em sua imagem. Além de colocar lentes de porcelana nos dentes, também fez um procedimento estético para minimizar as orelhas de abano e perdeu peso desde que intensificou os exercícios físicos. Sua barriguinha secou, e ele passou a biscoitar nas redes, postando fotos sem camisa. 

Também foi diagnosticado com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (tdah), com o agravante de aumento da sensibilidade auditiva. É comum vê-lo com os fones de ouvido da Apple mesmo quando rodeado de pessoas em um restaurante ou em uma reunião. Muita gente falando ao mesmo tempo é uma das coisas que mais agridem seus tímpanos. No momento em que se atracou com Ricardo Salles, no debate presidencial da Band, ele escutava O Sole Mio, cantada por Luciano Pavarotti. Janones passa boa parte do tempo descalço, como na live sobre a Farmácia Popular, por se incomodar com o barulho de seus próprios passos quando está de sapato. Pelas manhãs, toma um ansiolítico e um nootrópico (para melhorar a memória e a cognição). Para dormir, se medica com 5 mg de um indutor de sono.

Ao desistir de concorrer à Presidência em agosto deste ano, Janones se transformou no comandante da artilharia digital contra o clã Bolsonaro e no tanque de defesa para conter a disseminação de fake news. Ele jura em nome de seus milhões de seguidores que sua candidatura à Presidência não foi um balão de ensaio e que, de fato, desejava quebrar a polarização entre Lula e Bolsonaro. 

Na pesquisa Datafolha divulgada no dia 24 de março, o nome de Janones apareceu empatado com o de João Doria (psdb) nas intenções de voto, ambos com 2%, e à frente de Simone Tebet (mdb) e Felipe D’Avila (Novo), os dois com 1%. Na mesma pesquisa, Janones cravava 4% entre pessoas com renda de até 2 salários (ante 6% de Ciro Gomes e 2% de Doria), um feito para quem pertencia ao baixo clero do Congresso. 

Apesar disso, Janones se sentiu meio colocado de escanteio, inclusive por parte de integrantes da imprensa. Em abril, quando foi entrevistado por Roberto D’Avila, no programa que leva o nome do jornalista no canal GloboNews, o deputado foi questionado sobre o que achava do presidente da Argentina. Janones deu uma volta enorme, sem responder à pergunta feita. Então D’Avila perguntou se ele sabia o nome do presidente argentino. Janones titubeou e respondeu “Macron” – que é o presidente da França. O jornalista continuou, perguntando os nomes dos presidentes dos Estados Unidos e da China. O deputado só sabia o do primeiro. “Ao final da entrevista com as câmeras desligadas, ele me disse: ‘Espero que você perca essa eleição’”, lembra Janones, e depois o jornalista estendeu a mão para cumprimentá-lo. “Não tenho orgulho de, naquele momento, não saber o nome do presidente da Argentina, mas fazer um interrogatório foi grosseiro. Sem falar na mensagem que eu recebi no dia seguinte…”.

Roberto D’Avila mandou um longo áudio por WhatsApp, dizendo: 

Oi, André, como vai? Repercussão enorme, né? Pois é. Você, claro, cometeu uma gafe ali, você podia ter dito que não lembrava, você não foi humilde o suficiente. Eu vi que saiu chateado comigo, mas eu não fiz nada para fazer você ficar menor. Pelo contrário, eu te botei para cima. Foi um erro que você cometeu. Acho que você se saiu bem nas redes sociais, brincando com arroz e feijão e tal. Mas até isso você está errado, a premissa está errada. Porque a questão internacional incide diretamente no preço da gasolina, no preço do petróleo, no preço do arroz, do feijão, do gás mais ainda. Claro, tudo o que acontece lá fora, tudo repercute aqui dentro. Então, essa premissa também não está correta. Eu poderia ter dito isso para você, mas não quis falar. […] Meus parabéns de qualquer maneira, não fique triste, não. Grande abraço, bola para frente.

Janones nunca respondeu a D’Avila. Procurado pela reportagem, a assessoria da GloboNews mandou um comunicado sobre o caso: “O jornalista Roberto D`Avila garante que tratou o deputado com todo respeito, como sempre trata todos os seus entrevistados. Ele também não desejou que Janones não ganhasse as eleições – e não diria essa frase nem a ele nem a nenhum candidato. Como Janones saiu da entrevista insatisfeito com a gafe que cometeu, o jornalista mandou um áudio no intuito de mostrar que nada tinha contra ele. Mas se ele se sentiu desrespeitado, o jornalista avisa que essa não foi a sua intenção”.

Convidado para uma entrevista na CNN no início de junho, Janones e sua equipe estavam em uma sala de reunião convertida em camarim quando o âncora William Waack abriu a porta. “Sem olhar para a minha cara e sem necessariamente perguntar algo para alguém, ele começou a falar que eu era uma ‘piada’ e que deveria ‘aproveitar as eleições para brincar’”, recorda Janones. 

Waack saiu e fechou a porta, deixando os presentes boquiabertos – chegaram a pensar que o jornalista voltaria para dizer que se tratava de uma brincadeira, mas isso não ocorreu. Janones comentou essa situação no dia seguinte, em entrevista ao podcast do humorista André Marinho, apoiador de Bolsonaro em 2018. De acordo com o deputado, a emissora ligou para pedir desculpas. 

 Waack nega ter sido grosseiro com Janones. “Jamais pronunciei o que foi mencionado. Na sala, estavam presentes marqueteiros de outras nacionalidades, com os quais conversei em espanhol sobre diversas candidaturas em outros países. Sem mencionar a dele [Janones]. Ao final, um desses marqueteiros, indagado sobre como pensava em atuar no cenário brasileiro, declarou: ‘Ah, podemos brincar.’” O âncora afirmou que ninguém da CNN telefonou pedindo desculpas ao então pré-candidato. Não é verdade. A assessoria de imprensa da emissora afirmou que Lucas Câmara, diretor executivo de relações institucionais, ligou para Janones “em um gesto de cordialidade”, “para desfazer qualquer mal-entendido”.

Janones estava na mira de Lula havia algum tempo, pois já se tornara um fenômeno nas redes sociais. Quando o ex-presidente marcou uma reunião com Luís Tibé, presidente do Avante, em 2021, pediu que o deputado estivesse presente. Mas Janones preferiu não comparecer, apesar de sua admiração por Lula, de sua proximidade com o PT na juventude e de ter votado em Fernando Haddad para presidente em 2018. O motivo da recusa foi porque ele já cogitava sair candidato à Presidência, decisão que julgava inegociável. 

Em maio deste ano, Janones encontrou Gleisi Hoffmann em um evento na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), e os dois trocaram telefone. Depois, a presidente do PT mandou algumas mensagens ao deputado, propondo uma reunião para estabelecer uma base de diálogo. Janones não respondeu às mais de cinco mensagens. “A falta de resposta não era arrogância, mas era porque eu não tinha nada para conversar. Eu realmente achei que poderia furar a polarização”, diz Janones.

Em 11 de julho, após ser entrevistado no podcast O Assunto, Janones recebeu vários cumprimentos por suas declarações para a jornalista Renata Lo Prete, e estava de volta ao hotel quando chegou uma nova mensagem de Hoffmann. “Vou estar amanhã pela Câmara, gostaria de falar e ouvir sobre um assunto”, dizia ela. Então, pela primeira vez, o deputado respondeu: “Podemos, sim.” O encontro foi agendado para o dia 13 de julho, às 15 horas, no gabinete de Janones, de número 580, no Anexo III da Câmara dos Deputados.

Hoffmann falou sobre as ameaças que a democracia está sofrendo no Brasil e a necessidade de estabelecer um diálogo entre o pt e Janones. Não citou o termo “coligação” nem se referiu à desistência de candidatura. Ao final da conversa de 40 minutos, contou sobre o desejo de Lula de se reunir pessoalmente com Janones, que concordou com o encontro. Imediatamente, Hoffman pegou o seu celular, olhou a tela durante alguns segundos e disse: “O presidente Lula está aqui em Brasília hoje, você poderia encontrá-lo às seis da tarde?”

Surpreso, Janones disse que sim. “Então veio o que eu considero o ápice do respeito: a Gleisi me perguntou se eu gostaria que ele viesse até mim. Claro que eu não toparia, até porque estamos falando de um dos maiores líderes do mundo. Mas achei educado”, comenta Janones. A reunião foi marcada para às 18h30, no hotel Meliá Brasil 21, localizado a cerca de 4 km do Congresso Nacional. 

Antes de entrar na suíte do ex-presidente, Janones decidiu, por conta própria, deixar seu celular do lado de fora, a fim de transmitir confiança. Estavam na sala da suíte Hoffmann, o ex-senador Tião Viana (PT-AC), o fotógrafo Ricardo Stuckert e a socióloga Rosângela Silva, a Janja, mulher de Lula. O ex-presidente chegou quando todos já estavam acomodados nos sofás. “Tudo bem, seu Janones?”, perguntou. Ele disse que sim, e fez-se um breve silêncio. 

Janones nunca tinha encontrado Lula pessoalmente. Quando Hoffmann tomou a palavra para explicar a razão do encontro, ele interrompeu: “Desculpa, vou fazer agora justamente o que os meus assessores falaram para evitar. Mas vou seguir o meu coração. Eu não consigo começar essa reunião sem dizer que nasci em uma cidade de 100 mil habitantes, virava a noite vendo seus comícios em prol dos mais pobres. Quero expressar a minha satisfação em estar com o maior líder político do Brasil. Já critiquei o senhor, e irei continuar criticando, se achar que assim devo quando for preciso, mas o que nos une é algo muito maior. Estou dando os primeiros passos para fazer algo que o senhor almeja, trabalhando para isso desde os anos 1980: acabar com a fome do Brasil.” 

Todos ali abriram um sorriso. Então Janones retomou a palavra: “Dito isso, vamos agora conversar como dois presidenciáveis.”

A reunião durou 30 minutos. Em nenhum momento foi pedido diretamente a Janones que abandonasse a sua candidatura, embora aquele encontro tivesse exatamente esse objetivo. Pouco antes do fim da conversa, Lula fez um apelo: “Não existe ninguém com autoridade moral para pedir para você desistir. Eu mesmo já recebi esses pedidos inúmeras vezes ao longo da minha vida. Mas vou fazer outro pedido, para levar a partir dessa nossa conversa: reflita entre hoje até a data limite para o registro da candidatura sobre qual o papel que você quer desempenhar na defesa da democracia pelos próximos quatro anos.”

Janones entendeu o recado. O prazo limite para o registro de candidatura era dali a um mês, no dia 15 de agosto. Suas opções de fato eram apenas duas: ou tentar uma reeleição a deputado federal para ser a base de um possível governo Lula, ou seguir com o sonho da Presidência sabendo que iria perder. Antes de se despedir, Janones pediu o celular de Hoffmann emprestado para fazer uma selfie com Lula. Stuckert também fez uma foto oficial do encontro. 

O deputado mineiro seguiu tocando a sua agenda de pré-candidato. No dia 26 de julho, foi o entrevistado da sabatina Central das Eleições, da GloboNews. Uma das questões que lhe fizeram foi justamente sobre uma possível aliança com Lula. Ele respondeu que o timing já tinha passado. No dia seguinte, o PT foi para o ataque. Hoffmann usou a sua conta no Twitter para fazer elogios: “Parabéns, @AndreJanonesADV pela entrevista ontem e por suas propostas para o país. Sempre há tempo para dialogar sobre uma vida melhor para o nosso povo e na defesa da nossa democracia. Queremos continuar nossa conversa, com muito respeito e esperança no futuro.”

No dia 27, Lula e Janones se falaram por telefone e acertaram uma reunião presencial para o dia 4 de agosto, em São Paulo. O deputado chegou para o encontro junto com Luis Tibé, o presidente de seu partido. Também levou propostas para o plano de governo de Lula: fixar o Auxílio Emergencial em 600 reais e dar um complemento às mães-solo proporcional ao número de filhos; aumentar o número de beneficiários de programas sociais; fazer valer os direitos e a inclusão das pessoas com deficiência; criar uma secretaria ou um departamento do Ministério da Saúde para tratar da questão da saúde mental. O acordo foi selado no mesmo dia. Após o aperto de mão, Janones fez uma live com Lula para informar aos seus seguidores que acabava de desistir de sua candidatura à Presidência. “Lula achou estranho quando eu falei da live, foi preciso o Stuckert me ajudar a convencê-lo.”

O deputado diz que a experiência como pré-candidato à Presidência deixou claro para ele o abismo que existe entre o que pensam os menos favorecidos e o que pensam os mais abastados. Entre janeiro e junho deste ano, ele rodou vários estados do Nordeste. No município maranhense de Marajá do Sena, a 360 km de São Luís, onde boa parte das casas são de barro e não têm banheiro nem água encanada, Janones perguntou a alguns moradores da cidade se eles eram de direita ou de esquerda. As pessoas responderam dizendo se usavam a mão direita ou a esquerda no trabalho na roça. Ninguém soube dizer também o que era ideologia de gênero. “Muita gente discute nas redes sociais temas que não se conectam ao Brasil que está sentindo fome. Eu consigo me comunicar com mais gente porque falo de assuntos reais.” 

Janones nega ter interesse em algum ministério ou secretaria como recompensa pelo trabalho que tem exercido durante a campanha de Lula. Até porque, ao fazer propaganda para o ex-presidente nas redes, ele chama atenção para a sua própria campanha à reeleição. “É claro que toda essa discussão nas redes me traz visibilidade e deixa meu nome em exposição. Um assessor chegou a me falar que, ao retirar a minha candidatura à Presidência, eu iria sentir um baque, porque meu nome não seria mais falado pelas pessoas. Eu disse: ‘Você está enganado, agora que o negócio está começando.’” O deputado, porém, não descarta alguma projeção em um possível governo Lula. “Não vou mentir: falei para a Gleisi que quero ter abertura para apresentar projetos ao presidente, ter destaque na Câmara.”

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Reportagem atualizada às 13h40 do dia 28 de setembro de 2022.