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    O repórter Marcelo Castro nos tempos do Balanço Geral, da afiliada da TV Record na Bahia, da qual foi demitido em meio às suspeitas de ter criado um esquema para desvio de Pix de doações do público para as pessoas carentes que levava à tevê (Foto: reprodução)

anais da criminalidade

O Ibope subiu, e o Pix sumiu

Jornalistas da Bahia são suspeitos de roubar 500 mil reais de doações dos espectadores para pessoas pobres ou doentes que participavam de um programa da TV Record

André Uzêda, de São Paulo | 23 maio 2024_09h28
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Marcelo Castro, hoje com 36 anos, era uma estrela na TV Record da Bahia, na posição de principal repórter e substituto habitual do apresentador titular, o histriônico Bocão, na edição local do Balanço Geral, um programa que tem crimes, dramas humanos, assistencialismo e reportagens jocosas nas periferias. A popularidade lhe rendeu fãs e um Instagram com mais de 160 mil seguidores.

Por ter muitas fontes na polícia, sempre conseguiu acompanhar de perto, muitas vezes ao vivo, as operações de combate ao tráfico, de resgate de reféns em sequestros ou mesmo troca de tiros em bairros pobres de Salvador. Nessas ocasiões, aparecia vestido com um colete azul a prova de balas, com a logomarca da emissora estampada no peito.

Para não identificar os policiais durante as operações mais delicadas, chamava-os de “Juca”, apelido que se tornou um bordão. Assim, ajudava a rechear as quase quatro horas de programa, exibido das 11h50 às 15h30, de segunda a sexta-feira, e a fazer da atração um sucesso que chega a liderar a audiência no horário em  momentos, ultrapassando a liderança da afiliada local da TV Globo.

Nos últimos tempos, Castro estava chamando a atenção com campanhas para crianças e adultos pobres e doentes que precisavam de dinheiro para custear seus tratamentos.

Em 28 de fevereiro de 2023, foi ao ar a história de Guilherme, de apenas 1 ano de idade, que precisava do remédio Qarziba para o tratamento de um tumor no crânio e outro na barriga. Uma única ampola do medicamento custa na casa de 73 mil reais, e o menino precisava de cinco, somando 365 mil. A família entrou na Justiça para que o SUS fornecesse o remédio, mas o pedido foi negado. Recorreu então ao Balanço Geral. A mãe fez duas entradas ao vivo que somaram trinta minutos de duração, com uma trilha sonora dramática ao fundo. Na tela, o número da chave  Pix para doações.

O público respondeu rapidamente ao chamado da emissora, com um montante que chegou mais tarde a 109,5 mil reais. E então um espectador célebre apareceu: o jogador Anderson Talisca (nascido em Feira de Santana, revelado pelo Esporte Clube Bahia, e hoje colega de Cristiano Ronaldo no Al-Nassr, na Árabia Saudita) entrou ao vivo para avisar que arcaria sozinho com a primeira ampola. Ele estava em Salvador enquanto tratava uma lesão e estava assistindo ao Balanço Geral

Fora do ar, porém, o repórter tomou uma atitude que despertou a desconfiança do atleta. Ele passou para o staff do jogador um número de Pix diferente do que aparecia na tela, segundo o delegado Charles Leão, titular da Delegacia de Repressão a Crimes de Estelionato Por Meio Eletrônico, a DreofCiber

O advogado dividiu seu estranhamento pela diferença das chaves Pix e reportou a troca à direção da Record. “A gente não ia fazer o Pix para qualquer pessoa. Tivemos o cuidado de conferir quem iria receber o valor para só transferir quando fosse para a mãe da criança”, disse o advogado do atleta, Valderson Mendes, ao podcast PodZé, do apresentador Bocão, que se chama José Eduardo Alves.

Não se sabe exatamente o motivo da mudança, mas ela deflagrou uma investigação interna. A direção da emissora constatou que a chave Pix divulgada na tevê pertencia a um barbeiro, que não tinha relação formal com o programa. Constatou também que, dos 109,5 mil reais arrecadados entre espectadores, só 40 mil chegaram à família. De acordo com a Polícia Civil, os outros 69,5 mil reais foram roubados por envolvidos em um esquema de desvio de Pix.

Desse dinheiro, aponta a investigação, 27 mil reais foram para o bolso de Castro, o repórter que narrou o drama do garoto, distribuídos de maneira pulverizada – uma parte por boleto bancário pago pelo barbeiro e outras por transferências diretas, em movimentações feitas pelo motorista de aplicativo Lucas Costa Santos e pelo editor-chefe do programa Jamerson Oliveira. Os dois, diz a polícia, também embolsaram parte do dinheiro: o primeiro 9.000 reais, e o segundo, 31.500 reais. Tudo roubado dos recursos que deveriam ser usados para salvar a vida de um bebê, o que todos os nomes citados negam enfaticamente desde o princípio.

Essa história tem um fim trágico. O menino Guilherme não resistiu à doença e morreu dias depois do apelo feito na Record. Ainda na fase da investigação, a polícia chegou a levantar a hipótese de os desvios das doações terem relação direta com a morte, mas ela não consta no relatório final. “Nós ouvimos a médica que estava atendendo aquela criança. E ela foi muito enfática em informar que pelo estado avançado do tumor, já não se podia fazer mais nada. Mesmo com a aplicação dos remédios naquele momento, não poderia ter sido evitado o fator morte. Assim deixou-se de analisar qualquer dolo eventual em relação a um possível homicídio dessa criança”, explica o delegado Leão.

Em nota, a TV Record disse por meio do advogado que representa a emissora: “Após tomarmos conhecimento da fraude perpetrada com participação de dois colaboradores da emissora, elaboramos pedido de instauração de inquérito policial”.

A emissora também destacou que “todos os colaboradores que participaram da fraude foram desligados de suas funções, tendo a emissora tomado todas as medidas cabíveis, tanto do ponto de vista criminal, quanto do trabalhista”.

A piauí teve acesso ao relatório final da investigação, que incluiu a quebra dos sigilos bancários dos suspeitos. A conclusão é que o repórter Marcelo Castro e o editor-chefe Jamerson Oliveira eram líderes de um esquema criminoso, que desviou mais de 500 mil reais em doações, entre setembro de 2022 a fevereiro de 2023. 

O motorista de aplicativo Lucas Costa Santos, amigo de infância de Jamerson, é citado como “operador do esquema”, responsável por arregimentar pessoas que fornecessem as chaves Pix para serem divulgadas no programa, entre elas sua namorada, duas primas e sua mãe, além de outros amigos e conhecidos. Segundo a polícia, essas pessoas ficavam com uma pequena fatia do valor doado, a depender do que era amealhado.

O relatório embasou o indiciamento dos envolvidos e registrou que não restam dúvidas acerca da participação deles “na prática de crimes de estelionato, associação criminosa e lavagem de dinheiro” cometidos contra “pessoas carentes e em condição de vulnerabilidade social”. 

Ao todo, a Polícia Civil listou treze casos de pessoas que tiveram seus dramas contados na televisão, mas cujas doações foram em parte surrupiadas. O documento levanta a possibilidade de existirem outros “inúmeros casos, ainda não identificados, que possam ter ocorrido ao longo dos meses ou anos”.

 

A maior parte dos treze casos listados na investigação é de apelos feitos por mães para bancar tratamentos de saúde de seus filhos. São casos envolvendo crianças com câncer, com hidrocefalia, hidronefrose bilateral (doença nos rins), doença neurodegenerativa, deficiência intelectual. 

Há o relato de uma mãe e uma filha que entraram em contato com Jamerson Oliveira, pois o conheciam desde garoto. Elas queriam o contato de um advogado que as representasse na Justiça sobre um desmoronamento de terra que havia acontecido perto da casa onde moravam. O editor-chefe do Balanço Geral, então, convenceu a família a entrar ao vivo com Castro e, além de pedir a ajuda profissional, também solicitar doações para “manter suas despesas”. 

A polícia diz que a população baiana doou 27,6 mil reais naquele dia, mas só 11% chegou no bolso da família, enquanto Castro e Jamerson receberam 9.600 reais cada um, Lucas ficou com 4.300 reais e sua mãe, Rute Cruz da Costa, ficou com 149 reais.

Em 20 de dezembro de 2022, Castro entrou ao vivo pedindo ajuda para o recém-nascido Benjamim, que estava havia três meses internado no Hospital Martagão Gesteira, em Salvador. O bebê possuía uma síndrome genética desconhecida, além de cardiopatia e deficiência intelectual. A investigação concluiu o seguinte: as doações chegaram a quase 24 mil reais, mas só 4,3 mil reais foram repassados para a mãe do bebê; Castro e Jamerson ficaram, cada um, com 7 mil reais; Lucas, com 3.300 reais; e uma prima de Lucas com 2.300 reais.

A receita usada para prender a audiência durante o Balanço Geral caía como uma luva na estrutura do golpe montada pela dupla de jornalistas, segundo os investigadores. Os temas comoviam por tratar de dramas sociais, tinham um objetivo muito claro a ser alcançado e um senso de urgência que dependia da mobilização do telespectador. Os entrevistados, quase sempre, eram pessoas pobres e desesperadas por ajuda. Por isso, muitos não faziam objeções quando Castro explicava que usaria uma chave Pix de um terceiro para arrecadar o dinheiro. Ele dizia que o titular da conta era um funcionário da Record, ou alguém indicado pela empresa, como forma de “promover um maior controle” do valor repassado.

Uma das mães ouvidas na delegacia disse que tinha consciência que tinha sido enganada, mas teve receio de levar o caso adiante porque “eles são peixão grande”. O relatório pontua que o repórter tem “bastante influência na mídia e com bastante proximidade com o meio policial”. A conclusão é de que, de 500 mil reais arrecadados no período investigado, 75% dos recursos foram desviados. De cada 100 reais roubados, conclui, 43 reais ficavam com o repórter, 43 reais com o editor-chefe e o motorista de aplicativo dividia os outros 14 reais com as pessoas que emprestam o Pix. 

Em seu depoimento à polícia, quando perguntado sobre o esquema de fraude, o editor-chefe disse: “Nada sei.” E completou relatando que apenas conhecia a história do golpe de “ler na imprensa e ouvir nas entrevistas, sites e redes sociais”.

Já o repórter antecipou sua ida à delegacia antes mesmo de ser intimado. No mesmo dia, ao lado do seu advogado, gravou um vídeo para as redes sociais dizendo que fazia isso para “buscar informações e prestar esclarecimentos” à polícia.

O relatório diz que o jornalista queria “confundir a autoridade policial com argumentos falaciosos”, com o intuito de “livrar-se de um possível decreto de prisão temporária”.

Quando procurado pela piauí em 17 de maio, uma sexta-feira, Marcelo Castro respondeu por WhatsApp: “Boa Tarde. Se meu nome for citado irei processar você e a revista Piauí”.

Uma resposta semelhante foi dada por Jamerson Oliveira. “Oi, se meu nome for citado, irei processar você e o veículo.”

Em comum, os dois também indicaram que a reportagem procurasse o mesmo advogado, que representa a dupla no caso. O defensor Marcus Rodrigues, porém, disse que não poderia dar mais informações. “Não posso falar de algo que se encontra em sigilo procedimental”, respondeu.

Lucas Costa Santos, apontado como “operador do esquema”, não foi localizado para falar com a reportagem.

 

Quando a Record ingressou com uma notícia-crime na Polícia Civil contra Castro, em 11 de março de 2023, ele estava de férias, nos Emirados Árabes. Dias antes, havia anunciado o noivado com Daniela Mazzei, também repórter da Record. O casal recheava as redes sociais com suas aventuras em Dubai e Abu Dhabi, entre passeios na Grande Mesquita do Xeique Zayed e idas aos parques da Ferrari e da Warner Bros, mas decidiu então apagar os posts.

No dia marcado para o retorno ao trabalho, Castro foi demitido por justa causa da Record, mesmo destino do editor-chefe. Daniela continuou na emissora por mais 54 dias, até seu vínculo ser definitivamente encerrado.

Daniela não é suspeita pela polícia de participar do esquema, mas foi atacada nas redes sociais. Dias depois da acusação, ela declarou em um vídeo: “Não sei se Marcelo tem envolvimento com isso. O que quero falar hoje é por mim. Não tenho nada a ver com isso.”

Durante o inquérito, o profissional teve o padrão de vida questionado. Em depoimento na delegacia, declarou que recebia 8 mil reais mensais líquidos como salário na emissora, além de uma cota de merchandising de 3 mil reais e uma uma mesada entre 3 a 5 mil reais paga por sua mãe. Também fazia trabalhos extras para sites de Salvador, ganhando cerca de 3 mil reais por cada um. 

Com a quebra de sigilo bancário, a polícia encontrou movimentações muito mais vultosas. No período cercado pela investigação, entre créditos e débitos, Castro movimentou mais de 1,2 milhão de reais. A conclusão é que os valores “por si só, se mostram totalmente incompatíveis com sua renda informada” em interrogatório.

Apesar de dizer que recebia mesada da mãe, o repórter, na verdade, fez transferências para ela. Neste período, o repasse foi de 49 mil reais. Ele e Jamerson Oliveira também trocaram quantias entre si – 69,8 mil reais em transferências.

Das suas fontes pagadoras, quem lidera a lista é justamente Lucas, o motorista de aplicativo. Ele repassou 207,5 mil reais para Castro. Isso foi mais do que o dobro do que recebeu no período da própria TV Record, de quem era funcionário.

Quando questionado sobre a relação com Lucas, Castro disse que nunca tinha estado com ele pessoalmente e “nunca saiu ou bebeu com ele”. Entretanto, informou possuir um vínculo comercial com o motorista, tendo emprestado, por meio de Jamerson, um valor de 20 mil reais, sem garantias, a juros de 35% ao mês. 

Castro teve uma BMW (que vendeu recentemente) e se mudou para um edifício valorizado de Salvador, com vista para a Baía de Todos os Santos.

 

O último registro público de seu patrimônio é antigo, de oito anos atrás, em 2016. Naquele ano, o jornalista pediu licença da Record e se lançou candidato a vereador de Salvador pelo Partido Republicano Brasileiro, hoje Republicanos, ligado à Igreja Universal. Na declaração de bens obrigatória dos candidatos, disse possuir 56,4 mil reais, dos quais 10 mil eram em dinheiro em espécie, 1.400 reais na conta bancária e 45 mil reais do valor do seu carro, um Fox 1.6. 

A candidatura foi inscrita no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) como “Repórter Marcelo Castro”. O resultado nas urnas foi muito aquém do esperado: apenas 2.828 votos. Ele não se candidatou novamente.

Em outubro de 2021, antes das acusações sobre o golpe vir à tona, o repórter se envolveu em outra polêmica. Em uma madrugada na Avenida Garibaldi, durante uma blitz de alcoolemia, bateu sua BMW no fundo de uma viatura da Transalvador (superintendência de trânsito da cidade). Os dois carros ficaram destruídos, mas ninguém se feriu seriamente.

Os agentes pediram que Castro fizesse o teste do bafômetro, e ele se recusou. Diante da gravidade da ocorrência, foi encaminhado para a Central de Flagrantes da Polícia Civil, onde um inquérito foi instaurado. Depois, em nota, a polícia escreveu que os agentes da Transalvador informaram que o jornalista apresentava “capacidade psicomotora alterada para direção de veículo”.

Em entrevista ao site BNews, pertencente ao seu então chefe José Eduardo, Castro informou que teve um “mal súbito”, apagando enquanto dirigia. Durante o programa Balanço Geral, teve um espaço para tratar do assunto ao vivo. De máscara para se proteger da Covid, reiterou que tinha passado mal, associou o fato a uma dieta que vinha adotando e o fez perder 7 kg rapidamente, e negou ter ingerido qualquer tipo de bebida alcoólica antes do acidente.

“Graças a Deus meu carro tem seguro, o carro da Transalvador vai ser colocado na oficina para fazer o reparo. Coisas materiais a gente resolve depois. O importante é a vida. Porque hoje, infelizmente, poderia ter sido o meu enterro. Poderia ter sido vítima de um acidente, mas graças a Deus ele não permitiu. Outras pessoas também poderiam ter sido atingidas no momento que eu tive aquele mal súbito”, disse.

Entre outros jornalistas, a colisão com a viatura virou piada: diziam que Marcelo Castro é o único repórter na Bahia que, literalmente, bate de frente com as autoridades. A piada é ambivalente. Além de satirizar o acidente, também ironiza a cobertura feita pelo jornalista, tida como chapa-branca (ou seja, muito favorável aos agentes de segurança da Bahia, que registra os maiores índices de letalidade policial no Brasil).

O repórter já admitiu em entrevistas que tinha o sonho de ser policial. Contou que chegou a se inscrever duas vezes no concurso da PM, mas não fez a prova. Também já revelou que tem posse de arma por possuir o registro de certificado do CAC, de Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador.

Daniela Mazzei foi procurada para falar com a reportagem, mas disse que não tinha motivo e nem interesse em se pronunciar “por algo que não tem a ver” com ela. Informou ainda que, caso seu nome fosse citado na reportagem, acionaria a Justiça.

A Polícia Civil remeteu o relatório criminal ao Ministério Público da Bahia, em dezembro do ano passado. O MP respondeu pedindo a anexação de novas provas para perícia. Em nota, a Promotoria disse que encaminhou “os autos à Polícia Civil no dia 8 de abril para que fossem realizadas diligências complementares ao inquérito policial”. Ainda segundo o MP, algumas diligências já foram realizadas, mas outras ainda estão pendentes. O prazo final é de noventa dias. 

Apesar dos novos pedidos do MP, o delegado que conduziu a investigação afirmou que, em seu entendimento, já cumpriu todos os procedimentos da investigação, mas que a Polícia Civil fica “à disposição de qualquer outra demanda que o Ministério Público achar necessário”, disse Leão.

 

Quando a história do golpe das doações estourou na mídia baiana, as redes sociais de Marcelo Castro e Daniela Mazzei foram inundadas de comentários sobre o assunto. A pergunta mais frequente era “cadê o Pix, Juca?”, em alusão ao bordão usado pelo repórter.

Memes e figurinhas de WhatsApp com o rosto de Castro passaram a circular em conversas de jornalistas e em grupos dos mais variados temas. Muitos davam o relacionamento entre eles terminado, assim como a carreira profissional de ambos. Nenhuma das duas coisas aconteceu. 

Daniela repostou as fotos com Castro em suas redes sociais, mostrando que os dois continuavam juntos. No Dia dos Namorados daquele mesmo ano, trocaram juras de amor dando ênfase à fase de tormenta que atravessavam.

“Felicidade é saber que você está comigo nos momentos bons e ruins. É saber que posso contar contigo pra tudo. Que você vai me dar a mão e me ajudar a enfrentar as piores coisas. É sobre o maior amor desse mundo”, escreveu o então noivo.

Sem contrato com a tevê, eles se reinventaram no mundo digital. Daniela abriu um canal no YouTube e passou a postar no seu Instagram conteúdos de variedade – com dicas de português apresentadas em dancinhas, técnicas para melhorar a dicção e dublagens de áudios famosos da internet.

Castro abriu um portal de notícias chamado Alô Juca, com amplo destaque para a editoria de polícia. Na aba que explica o trabalho desenvolvido no site, consta que é “um jornalismo imparcial e ético, pautado pela busca pela verdade e pela transparência”.

Numa das matérias publicadas no Alô Juca, em maio de 2023, foi abordada a história do Pix na Record, dando sua versão para as suspeitas, citando o nome de Bocão. O título diz: Depoimento revela que Zé Eduardo “morria de medo” de Marcelo Castro. O texto cita uma fonte não identificada segundo a qual o apresentador agiu por receio contra o repórter por ter receio de que este tomaria “o lugar dele no programa futuramente”. Entre as palavras-chave listadas ao pé do artigo, está listado o termo “inveja”.

Naquela época, a reportagem procurou Castro para saber quais novos elementos tinha sobre o apresentador José Eduardo. Ele prometeu trazer informações exclusivas, mas nada foi apresentado.

Dois meses depois, o acusado deu uma entrevista no PodTchaca, um podcast comandado pelo policial militar da ativa Lázaro Alexandre Andrade, conhecido como Alexandre Tchaca Tchaca, réu por suspeita de participação em uma chacina policial no bairro do Cabula, em Salvador, em 2015. Lá, Castro negou qualquer participação no golpe do Pix e prometeu que iria dar a volta por cima. “Vou retornar para a mídia. Grandão, sem medo. Assim como sempre fui.” 

A promessa, de fato, se concretizou em abril deste ano. Castro recebeu um convite para retornar à televisão, como apresentador da TV Aratu, afiliada do SBT na Bahia. Daniela foi admitida como repórter e Jamerson Oliveira como editor-chefe. 

A emissora espalhou outdoors na capital baiana anunciando a nova contratação, mas internamente sua chegada foi controversa. O veterano apresentador Casemiro Neto, com dezesseis anos de TV Aratu, cedeu o horário do meio-dia para o recém-chegado, e foi transferido para as 6 horas da manhã. Na sua despedida, fez uma declaração que alguns colegas entenderam como uma alfinetada: “A gente vai começar o dia sempre bem-informado, com a minha cartilha de jornalismo: ética, credibilidade, honestidade e respeito (…). Mas o mundo vira tanto que a gente pode voltar.”

Ana Coelho, diretora de jornalismo da TV Aratu, foi procurada, mas não respondeu às mensagens da reportagem.

No teaser de apresentação do novo programa, batizado também de Alô, Juca, Castro repete bordões policiais ao dizer que já está “no terreno” e faz odes à letalidade policial: “A Polícia Militar não tem que resgatar vagabundo nenhum, não. Deixa lá na mata. Deixa que o urubu come”. 

Cinco dias depois de reestrearem na tevê triplicando a audiência na emissora, Castro e Daniela se casaram em uma cerimônia pequena, reservada apenas para os familiares. 

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