Retirada de corpos da vala clandestina em 1990: “Não dá para descartar nem um ossinho solto”, diz o antropólogo José Baraybar, que já passou por Ruanda, Bálcãs e Kosovo CRÉDITO: MARCELO VIGNERON_1990
A cova rasa do Brasil
Pesquisa para identificar desaparecidos políticos descobre que a maioria dos mortos na cova clandestina de Perus é formada por pobres da periferia paulistana
Gabriela Mayer | Edição 194, Novembro 2022
“É uma velhinha?”, perguntou uma das crianças em torno da mesa retangular do laboratório. Sobre o tampo do móvel, em cima de um pano azul, havia um esqueleto. A cirurgiã-dentista Talita Máximo, uma das pesquisadoras que guiavam a visita escolar, respondeu que não, não era uma velhinha. “É uma moça que tinha entre 20 e 30 anos quando morreu.” A criança apontou para a mandíbula: “É que não tem nenhum dente.” Especializada em odontologia legal, Máximo explicou: “A gente consegue ver que ela nunca recebeu tratamento dentário e perdeu todos os dentes, é provável que eles tenham sido arrancados quando ela era adolescente.”
A visita dos estudantes à sede do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (Caaf), em São Paulo, era para conhecer o trabalho de identificação das ossadas da Vala de Perus – uma cova coletiva descoberta em 1990 no Cemitério Municipal Dom Bosco/Colina dos Mártires, no distrito de Perus, na Grande São Paulo. Investigações concluíram que naquela cova a ditadura militar enterrou, de maneira clandestina, presos políticos e outras pessoas. Até hoje não se sabe com precisão quantos corpos foram jogados ali, embalados em sacos.
Reportagens apuradas com tempo largo e escritas com zelo para quem gosta de ler: piauí, dona do próprio nariz
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