Um articulista nas cordas
| Edição 112, Janeiro 2016
O ARTICULISTA NAS CORDAS
Comparar o New Deal de Roosevelt com o petismo de Lula? O que o autor de “O lulismo nas cordas” (piauí_111, dezembro) andou fumando? Depois de ler o artigo, pensei em pedir um crédito de seis páginas da piauí – e o reembolso do Alka-Seltzer que tive que tomar.
MARCOS CARVALHO_SÃO PAULO/SP
Sou assinante da revista há não sei quanto tempo. Mesmo antes de assiná-la, já a comprava na banca. É com prazer que todo mês a encontro sobre o tapete na entrada do apartamento. Sorrio, satisfeito, na antecipação de uma leitura prazerosa sobre temas variados, do país e do mundo. Matérias bem escritas, reportagens com profundidade e bem fundamentadas. Faço propaganda da revista. Ela apresenta fatos e, eventualmente, sugere sua opinião sobre algum assunto. Na maioria das vezes, deixa a cargo do leitor a tarefa de ser o juiz do que está sendo apresentado.
Nesse mês, no entanto, ofereceram oito páginas para que o cientista político André Singer defendesse a presidente Dilma e o lulopetismo. O timing não poderia ter sido pior! Uma defesa: é isso o que o autor faz, indecorosamente. Comparar com Roosevelt? Dizer que Dilma teve a “coragem” de reduzir os ganhos da poupança? Estabelecer o confronto com Eduardo Cunha como razão do pedido de impeachment? Defender que o problema de Dilma é ser uma heroína incompreendida? Valer-se do incansável discurso que opõe esquerda e direita, socialismo e neoliberalismo? Não era isso que esperava encontrar na piauí. Esperava que a revista fizesse seu trabalho de maneira eficiente e contundente, como aquele que há anos vem me satisfazendo: que entrevistasse o André Singer, lhe propusesse perguntas, pesquisasse a coerência das respostas. Ouvisse as pessoas mencionadas e registrasse suas interpretações dos fatos.
Se eu conseguir me recuperar desse estado de estupefação, pretendo, dentro das minhas limitações, ir além do desabafo e responder ao texto de André Singer. Nem que seja como um exercício intelectual, à maneira do que a revista, ao longo de todos esses anos, me ensinou a fazer.
PEDRO RUHS_SÃO PAULO/SP
Sou leitor inveterado da piauí. Hoje, porém, levei um susto. Na capa da edição 111 se anunciava um artigo de André Singer, com uma chamada instigante por sugerir algo inesperado, se escrito por ele: “Colapso do lulismo”. Ao ler o texto, outro susto. Piauí estava publicando um texto incompatível com a sua tradição. Ideológico, eivado de afirmações equivocadas e de informações falsas, o artigo revela uma percepção que, por lhaneza, classifico apenas como ingênua a respeito do que vem se passando no país. O senhor André Singer concedeu-se até enxergar nos dois mandatos de Lula um “ciclo rooseveltiano”. Não aceito que a revista alegue ter decidido publicar o texto em nome da pluralidade. Para aceitar isso, seria preciso que os argumentos fossem sérios, as informações, corretas, e houvesse boa-fé. Espero que tenha sido apenas uma escorregada da piauí. Não quero ser privado do prazer de lê-la tal como sempre foi.
WAGNER TAVARES_SÃO PAULO/SP
Acompanho sempre com interesse a Tribuna Livre da Luta de Classes. Gostei da análise sociopolítica clara e abrangente no artigo “O lulismo nas cordas”, de André Singer. Um parágrafo, porém, me deixou perplexo. É o que se refere aos avanços no padrão socioeconômico dos trabalhadores de carteira assinada durante o governo Lula: “Viagens de avião, tratamento dentário, automóvel e diploma universitário se tornaram acessíveis a camadas populares.” Como assim? Alguém pode me explicar como uma renda familiar popular possibilitaria viagens de avião, tratamento dentário e automóvel?
GIANFRANCO BELLINZONA_RIO DE JANEIRO/RJ
Ou André Singer é distraído, ou muito seletivo em suas leituras: no artigo “O lulismo nas cordas”, foi até a edição de outubro da revista (“Dentro do poder”, piauí_109) buscar nos diários de FHC referências negativas ao deputado Eduardo Cunha, mas não se preocupou em ler, algumas páginas adiante, “O ralo”, de Consuelo Dieguez, a respeito dos incríveis e mal explicados dispêndios do BNDES. Aliás, o banco, os campeões nacionais e a irresponsabilidade fiscal não aparecem em seu texto.
Se houvesse lido “O ralo”, teria que substituir o lema que utilizou para caracterizar o ajuste “antirrooseveltiano”. A expressão “a Constituição não cabe no Orçamento” teria que ser substituída por “a corrupção, o compadrio e a ineficiência não cabem no Orçamento”. E também, claro, Singer não poderia culpar, como culpa, o “capital” pelo isolamento do governo e pelo fim da experiência desenvolvimentista.
O texto do intelectual petista prossegue descaradamente parcial, além de saudosista: canta como vitórias a redução forçada das taxas de juros e o desmantelamento do setor elétrico em 2012, sem dizer que hoje, como consequência daquelas ações, as taxas estão nas alturas, a inflação alcança os dois dígitos, e a Petrobras está arrasada – entre outras coisas, por ter sido obrigada a segurar artificialmente o aumento dos preços de seus produtos.
Os responsáveis pela derrocada petista elencados por Singer são o cenário internacional, o capital, a burguesia, a imprensa, o PJ (sim, o “Partido da Justiça”), Eduardo Cunha, quase todo mundo. A falta de autocrítica e a camisa vermelha o impedem de mencionar o projeto de poder a qualquer custo, a ocupação sindical do Estado e a incompetência.
WANDERLEY RODRIGUES_RIO DE JANEIRO/RJ
André Singer faz uma análise clara, didática e minuciosa da situação atual do lulismo no país, apesar dos inúmeros adjetivos tendenciosos espalhados pelo texto. Sugiro a publicação de um novo artigo do cientista político, dessa vez propondo soluções – uma vez que, como ele mesmo declarou, por enquanto a alternativa que existe é o projeto neoliberal.
VERA MORAES_CURITIBA/PR
DIREITA, VOLVER!
“Cara, esta é uma revista de direita.” Essas eram as palavras de um colega de trabalho, sempre em tom de galhofa, cada vez que eu chegava com um exemplar da piauí nas mãos para mostrar as reportagens de que eu mais havia gostado naquela edição. Normalmente, eu discordava. Afirmava que a revista tinha múltiplos enfoques, e que quando abordavam temas brasileiros, suas reportagens tendiam a ser equilibradas, mostrando diversos ângulos do mesmo assunto. Não mais. Duas reportagens na edição de outubro de 2015, e uma na de novembro, parecem indicar uma curva à direita do espectro político, por parte da piauí.
A primeira é “Na estrada com o Pixuleco” (piauí_109, outubro), em que Roberto Kaz acompanha a senhora Celene Carvalho em suas viagens pelo Brasil a fim de narrar as aventuras de uma estimuladora do ódio antipetista, acompanhada de um boneco inflável que representa o ex-presidente Lula vestido como um presidiário. Trata-se da exposição de uma militante da nova extrema direita brasileira. Na segunda reportagem, “O ralo”, Consuelo Dieguez aborda os empréstimos do BNDES. Para preencher as cerca de dez páginas da revista com sua matéria, a repórter teve que relembrar fatos desde a fundação do banco, em 1952, quando ele ainda se chamava BNDE. Depois de citar bilhões para lá e bilhões para cá, Dieguez dá voz aos economistas de quase sempre: José Roberto Afonso, ligado ao PSDB, como ela cita; Mansueto Almeida e Eduardo Giannetti da Fonseca, como de costume a questionar as políticas de empréstimo do banco. Termina o texto recordando os 7 a 1 da Alemanha sobre o Brasil. Vai ver foi o BNDES que convidou Scolari para treinar a Seleção Brasileira. Uma reportagem dessas não estaria fora de lugar na Folha de S.Paulo ou na Veja. Claro que esses veículos não publicariam mais do que duas páginas de texto.
Por fim, já na edição de novembro, há a reportagem de Malu Gaspar sobre a Petrobras, “À deriva” (piauí_110). A repórter narra as intrigas na nova diretoria da estatal, tentando convencer o leitor de que a situação da Petrobras é catastrófica. Devo ter desistido da leitura na segunda página. Não é preciso ler quatro ou cinco páginas na piauí para chegar à conclusão de que a situação da Petrobras é catastrófica. Como disse, a Folha e a Veja dizem o mesmo em apenas duas. O que não significa que a conclusão seja verdadeira. O BNDES deu lucro de 3,5 bilhões de reais no primeiro semestre de 2015. O lucro da Petrobras, no mesmo período, foi de 5,3 bilhões de reais.
Há alguns anos venho comprando sempre a revista em banca (tenho preguiça de assinar). Vamos ver se vai valer a pena continuar a fazê-lo, ou se a revista está a se tornar, lentamente, uma Veja mensal.
JOSÉ ALFREDO RODRIGUES_PORTO ALEGRE/RS
FISCAIS DA FLORESTA
Parabéns pela excelente reportagem “O mentor” (piauí_111, dezembro). Ver pessoas seriamente comprometidas com a preservação das florestas é uma alegria muito grande, que traz esperanças – ultimamente temos visto apenas destruição e corrupção neste país.
JOSÉ ROBERTO ZORZETO_SÃO JOÃO DA BOA VISTA_SP
MÁ LEITURA
No bom artigo “Massacre no canal Saint-Martin” (piauí_111, dezembro), Ruy Fausto propõe, como parte de uma saída política no combate em várias frentes ao Estado Islâmico, “enfrentar o governo de Israel, mas também o Hamas”. Já a legenda da foto que ilustra o texto afirma que a ação do Estado israelense contribuiu para a deterioração da situação no Oriente Médio. Vocês sabem a diferença entre governo e Estado, certo? Enquanto Ruy Fausto se refere sempre ao governo de Israel em seu texto, piauí, numa má leitura, dá a entender que o problema é o Estado de Israel – independentemente de qual seja o governo. Sem falar que, na legenda, a revista se esqueceu de mencionar o Hamas, citado por Fausto.
RICARDO BESEN_SÃO PAULO/SP
NOTA CONTRITA DA REDAÇÃO: Quando nos acusam de simpatizar com o campo político de fulano, podemos sempre nos defender mencionando a tonelada de leitores prestes a cancelar assinaturas – gesto que consideramos rude e açodado – por não aguentar mais nosso proselitismo em favor de beltrano (Fulano e beltrano militaram juntos quando jovens, e chegaram mesmo a achar graça um no outro, mas hoje se odeiam). Nesse caso, contudo, não há defesa possível. Erramos.
LOUCOS DE PALESTRA
Já estava me acostumando a encontrar na seção de cartas da revista uma amostra grátis mensal dos “loucos de palestra”, temperada pela análise política pedestre, ora chamando a revista de esquerda caviar, ora de coxinha. Eis que no mês passado deparei não com uma, mas duas cartas vociferando contra a matéria “No país dos caubóis” (piauí_109, outubro), assinada por Paula Scarpin.
Primeiro, um leitor insatisfeito reclama dos adjetivos empregados no texto, exige que se reconheça a complexidade inerente ao mundo dos rodeios, tenta ofender a repórter, chamando-a de carioca-comedora-de-orgânicos, como se origem e hábito alimentar fossem qualidades depreciativas, para enfim reclamar do subtítulo e da rapidez com que foi tratada a questão animal no texto. Lamentável. Além da deselegância, reveladora do clima que se quer impor a qualquer debate hoje no país, o moço crescido no interior, cujo referencial de evento é uma feira agropecuária, nem sequer esconde a universalização do próprio umbigo que pratica ao se referir a ele e aos amigos como leitores que foram feitos de bobos. A reportagem é excelente justamente por dar uma perspectiva urbana ao tema tradicionalmente tratado não só como rural mas também caipira. Ao atentar para o showbiz sertanejo e agropecuário, a matéria nos lembra que vivemos em um país multicultural. O retrato do locutor ao longo do texto é, na minha opinião, uma charmosa fuga do clichê nas em geral aborrecidas reportagens sobre rodeios, em que se fala muito dos bípedes que se equilibram sobre quadrúpedes, ou dos maus-tratos destes.
Como se isso não bastasse, uma leitora esperneia contra o retrato feito – é verdade que de passagem – do defensor dos animais, segundo ela apresentado como ingênuo defensor de causa sem importância. A ingenuidade parece estar na leitura e na interpretação do texto, porque a mera posição política do indivíduo não o coloca numa torre de marfim, isento de incoerências e de eventualmente ser superficial. Ninguém alfabetizado nega a importância do tratamento dado aos animais nesse tipo de evento, tampouco a revista. O que a alfabetização parece não estar dando conta é de conferir capacidade crítica aos intérpretes que, como no debate político vigente no país, enxergam o mundo apenas em azul ou vermelho. Parabéns, Paula Scarpin. Continue incomodando.
ÁLVARO MERLOS AKINAGA CORDEIRO_SÃO PAULO/SP
NOTA SUPLICANTE DA REDAÇÃO: Não incentiva, Álvaro. Nesse momento, Paula Scarpin circula pela redação cantando Então É Natal da Simone em voz alta.
PINGUINS E MAIS PINGUINS
Li somente as cartas da edição 111, e não gostei de saber que uma moça de São Paulo, moça essa que vai tentar passar no vestibular e que teve uma relação complicada de amor e ódio com a revista, ganharia um pinguim. Pois bem: já passei em três vestibulares e tenho com a revista, desde seu primeiro número, uma relação de puro amor. Também quero um pinguim.
AGUINALDO DUTRA BRANDÃO_MANHUAÇU/MG
Assinante e colecionador da piauí desde o primeiro número, nunca ganhei – tampouco pedi – nada dessa revista, a não ser o prazer de lê-la. Por isso, em consonância com os direitos dos leitores mais do que assíduos, venho solicitar o envio de um pinguim para a minha residência.
P.S.: Se possível, enviem dois, pois pretendo oferecer um de presente a uma pessoa amiga, com o compromisso de torná-la mais um assinante da revista.
ALAN BARRETO_VITÓRIA/ES
Era o nosso aniversário de um ano de casamento. Cerquei-me de todos os cuidados para que o evento fosse celebrado da melhor maneira possível. Mar com água tépida e cristalina; pousada escolhida com bastante critério – também utilizado na definição do roteiro gastronômico. Contudo, eis que, já no primeiro dia, ao sairmos da pousada em direção à praia, surgiu um contratempo, algo completamente imprevisto. Dada a desproporção de tamanho entre sua bolsa e a piauí, minha esposa se recusou a transportar a minha revista. Aceitei, ainda que contrariado, a recusa. Aceitarei também, como maneira de compensar todo esse desnecessário desgaste, um pinguim de presente.
CLÁUDIO KUPIDLOWSKY FERNANDES_BELO HORIZONTE/MG
NOTA GERAL PARA OS PEDINTES: Vocês não viram a capa de dezembro? Papai Noel morreu soterrado pela lama
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ERRATA: Na reportagem “O mentor” (piauí_111, dezembro), a revista errou ao afirmar que quase 1 trilhão de reais deixaram de ser emprestados aos proprietários rurais da Amazônia que não estivessem em dia com a legislação ambiental, entre 2008 e 2011. O valor que deixou de ser emprestado foi de 2,9 bilhões de reais.