FOTO: ACERVO PESSOAL
“Me sinto totalmente segura para voltar”
Costureira aguarda com impaciência o momento de retornar à Cidade do Samba, onde ajuda a fazer as fantasias dos desfiles cariocas
O medo deu lugar à esperança, e agora Ana Cláudia da Silva, de 52 anos, tem convicção de que haverá desfile no Sambódromo em julho de 2021. Ela tece fantasias para o Grupo Especial do Carnaval carioca há duas décadas. O trabalho que costumava realizar na Cidade do Samba – área no bairro da Gamboa onde se concentram os barracões das agremiações carnavalescas – é sua única fonte de renda. Hoje na Unidos da Tijuca, sua escola do coração, a costureira já passou por Salgueiro, Portela e Grande Rio. Impaciente para retomar a atividade que tanto ama, Aninha, como é conhecida, deposita toda a fé na vacina e na máscara.
Ela mora com o marido em Pilares, na Zona Norte do Rio, em um terreno dividido com a sogra. Nenhum dos três contraiu a Covid-19, mas as dificuldades financeiras bateram à porta da família: como o coronavírus paralisou completamente os barracões, Aninha só não ficou totalmente desamparada porque conseguiu receber o auxílio emergencial.
Em dezembro, a Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa) definiu as datas e a ordem dos desfiles, o que aumentou a expectativa da costureira pelo início da produção de fantasias, adereços e carros alegóricos. Sua Unidos da Tijuca será a quarta agremiação a se apresentar na segunda-feira de Carnaval, transferida para 12 de julho. Entretanto, a Liesa condiciona a realização dos desfiles ao bom andamento da vacinação contra o coronavírus no país.
Também em dezembro, a Unidos da Tijuca lançou oficialmente o seu enredo para 2021 em uma feijoada na quadra da escola. Waranã – A Reexistência Vermelha vai contar a lenda que retrata as origens do guaraná e do povo indígena Sateré Mawé, na Amazônia. Assim como as outras escolas do Grupo Especial, o Pavão (como é conhecida a Tijuca) está promovendo um concurso virtual para definir o samba-enredo. Em anos de preparação normal, a escolha já teria ocorrido há dois meses.
Em depoimento a Hellen Guimarães
“Trabalho na Unidos da Tijuca, com muito prazer. É a minha escola. A pandemia atrapalhou minha vida, sim, mas nem tanto. Eu sinto mais pelas pessoas que passaram por muita coisa ruim. Aqui, graças a Deus, ninguém teve a doença. Mas a rotina antiga está me fazendo falta, porque adoro trabalhar nos barracões das escolas. Eu tenho vinte anos de Carnaval, com muita honra. Comecei no Salgueiro, passei pela Portela, depois fui para a Grande Rio e agora estou na Tijuca. É a escola em que permaneci por mais tempo. Planejo retornar ao barracão assim que essa pandemia acalmar, se Deus quiser. Me sinto aflita porque os preparativos estão demorando para começar. Bate uma impaciência, sabe? Não vejo a hora de tudo voltar ao normal.
Eu moro em Pilares, com meu marido, na casa de cima. Minha sogra vive na de baixo. Estamos todos por perto. Não deixei de ir à rua durante a fase mais dura da pandemia, mas saía apenas rapidinho, para o mercado. Sempre fui muito caseira, o que tem me ajudado neste momento. Claro que tudo isso afeta nossa situação financeira. Dei entrada no auxílio emergencial e, graças a Deus, fui contemplada. Essa ajuda adiantou muito o meu lado.
O Carnaval é minha única fonte de renda. Quando acabo de trabalhar, guardo um dinheirinho e faço ele render até os preparativos do ano seguinte começarem. Em casa, só quem tem trabalho fixo, com carteira assinada, é o meu marido. Agora, com o fim do auxílio, não sei como vai ficar… Pretendo ir logo à Cidade do Samba para ver se a escola vai chamar a gente mesmo, se o serviço vai reiniciar dentro do barracão.
Quando não estou trabalhando, dependo muito do meu marido. Se tudo der errado e a vacina não chegar a tempo de ter Carnaval, vou tentar conseguir um emprego em facção [tipo de contrato, muito comum para costureiras, em que a contratante paga não pelas horas trabalhadas, mas por peça confeccionada]. O que não posso é ficar parada.
Depois de tanta incerteza, saber que já definiram as datas e a ordem dos desfiles me dá esperança de que a produção vai começar em breve, mesmo que aos poucos. Eu me sinto totalmente segura para voltar. É só a gente tomar precaução, manter o distanciamento, usar máscara… Ela é essencial, precisamos usar. Apesar dos pesares, estou otimista e bem convicta de que teremos um belo Carnaval. Vamos torcer para que, até julho, todo mundo já esteja vacinado. Seria maravilhoso ver o público de novo no Sambódromo, ainda que de máscara, por precaução. Eu vou estar lá, incentivando a minha escola, se Deus quiser.”
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