Onde está a fidalguia?
O único clube que meu pai admitia era o Fluminense. Chegava a ser comovente o orgulho com que ele falava da organização, da ética, do respeito à hierarquia. Gostava de citar uma tal de Taça Olímpica, da qual eu nunca mais ouvi ninguém falar, e que tinha o Fluminense como seu único detentor entre todos os clubes brasileiros. (Fui ver agora na wikipédia: trata-se de um troféu criado em 1906 pelo Barão de Coubertin, para “premiar a instituição ou associação com histórico de méritos e integridade no desenvolvimento ativo do Movimento Olímpico”. O Fluminense o conquistou em 1949.)
O único clube que meu pai admitia era o Fluminense. Chegava a ser comovente o orgulho com que ele falava da organização, da ética, do respeito à hierarquia. Gostava de citar uma tal de Taça Olímpica, da qual eu nunca mais ouvi ninguém falar, e que tinha o Fluminense como seu único detentor entre todos os clubes brasileiros. (Fui ver agora na wikipédia: trata-se de um troféu criado em 1906 pelo Barão de Coubertin, para “premiar a instituição ou associação com histórico de méritos e integridade no desenvolvimento ativo do Movimento Olímpico”. O Fluminense o conquistou em 1949.)
Lembro do meu pai contando, cheio de brio, o que houve no clube logo depois da conquista do campeonato estadual de 1969. O treinador Telê Santana e o preparador físico Antônio Clemente se desentenderam, e a questão chegou ao presidente, Francisco Laport, na base do “ou eu ou ele”. Cioso de suas responsabilidades, Laport se decidiu pela demissão dupla. O Fluminense estava acima de tudo, ambos eram empregados do clube e deveriam pensar nele em primeiro lugar. Saem os dois.
Cresci ouvindo histórias assim, embora depois eu tenha passado a desconsiderá-las: futebol é futebol, e na hora em que o bicho pega a gente comemora vitória com gol de mão e celebra o juiz que não marcou aquele pênalti escandaloso a favor do adversário. Os rubro-negros festejaram, em 2007, o erro do juiz Djalma Beltrami na anulação do gol de Dodô, no último minuto da decisão do estadual. Da mesma forma que os tricolores saudaram, em 2000, a milagrosa subida da terceira para a primeira divisão.
De qualquer modo, para quem se acostumou a associar o Fluminense ao rigor e à dignidade, é um despautério ler – como saiu terça-feira em quase todos os sites esportivos – que o atual presidente preferia Ney Franco para a função de novo técnico, mas que acabara prevalecendo a vontade de quem manda hoje no clube: o milionário dono de um plano de saúde que presta serviços pra lá de duvidosos a seus associados.
Independentemente do acerto ou não da escolha de Vanderlei Luxemburgo – que eu considero infeliz, mas esse não é o assunto do post –, é surpreendente ver a que ponto chegamos. Ok. Futebol se profissionalizou. Passou a movimentar dinheiro a rodo. Não se mantém um bom time sem grandes investimentos. E todos sabemos que, sem a Unimed, o Fluminense talvez não tivesse como encarar o Íbis. Mas, adaptando os versos de Noel Rosa, creio que é o caso de cantar:
E o povo / Já pergunta com ironia / Onde está a fidalguia? / Onde está a fidalguia?
Meu pai, a essa altura, deve estar se contorcendo todo no túmulo.
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