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Os italianos são os verdadeiros reis da milonga

Malandro de verdade não dá pinta de malandro pra não levar rasteira da própria malandragem.

Desde que começamos a gostar de futebol, aprendemos que os argentinos são insuperáveis na catimba – ou milonga, como diziam os locutores da minha infância. Dissimulados, cínicos, provocadores, pedem falta quando têm certeza de que a fizeram, batem na maldade, reclamam o tempo todo, percebem rapidamente quando um juiz é frouxo e manipulável. Nada disso é falso, embora tudo também possa ser relacionado ao nosso jeito de jogar. Quando a bola rola, somos iguais a eles: não valemos nada. Se não está errado associar os jogadores argentinos à boa malandragem, também não é certo entregar-lhes o título assim, de mão beijada.

| 09 abr 2014_14h34
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Malandro de verdade não dá pinta de malandro pra não levar rasteira da própria malandragem.

Desde que começamos a gostar de futebol, aprendemos que os argentinos são insuperáveis na catimba – ou milonga, como diziam os locutores da minha infância. Dissimulados, cínicos, provocadores, pedem falta quando têm certeza de que a fizeram, batem na maldade, reclamam o tempo todo, percebem rapidamente quando um juiz é frouxo e manipulável. Nada disso é falso, embora tudo também possa ser relacionado ao nosso jeito de jogar. Quando a bola rola, somos iguais a eles: não valemos nada. Se não está errado associar os jogadores argentinos à boa malandragem, também não é certo entregar-lhes o título assim, de mão beijada.

Pra mim, os maiores no quesito são os italianos. Especialistas na arte de comer pelas beiradas, os italianos têm, de cara, o mérito de zombar das estatísticas: tudo já aconteceu com eles. Perderam com grandes times – o de 70, que tinha Fachetti, Sandro Mazzola, Riva e Rivera, era ótimo. Ganharam com times fracos – não dá para entender como alguém pode ser campeão do mundo com Materazzi na zaga e Luca Toni de centroavante. Perderam em casa, em 1990. Ganharam em casa, o que aconteceu ainda na Idade da Bola Lascada, em 1934, mas aconteceu. Perderam duas finais para os brasileiros, em 70 e em 94. E ganharam uma da gente – sim, ganharam sim senhor, porque a verdadeira decisão da Copa de 82 aconteceu no estádio Sarriá, em Barcelona, no maldito jogo que representa para os brasileiros nascidos entre a metade da década de cinquenta e o início da de setenta trauma equivalente ao dos mais antigos quanto ao Uruguai.

A última Copa das Confederações trouxe uma surpresa boa: a seleção italiana jogando de peito aberto e partindo pra cima. Mas não vamos nos iludir: Copa das Confederações é uma coisa, Copa do Mundo é outra. O que eles fizeram por aqui no ano passado está longe de ser a garantia de que continuarão praticando futebol, e não dissimulando.

É verdade que nem sempre a coisa funciona. Em 2010 a seleção italiana começou mal, continuou mal e, apesar de todo mundo avisar que era bom tomar cuidado com ela, porque na hora H o time crescia e aparecia, a Itália conseguiu ficar em último lugar no grupo que tinha Paraguai, Eslováquia e Nova Zelândia. Fiasco.

Agora, nas eliminatórias, passaram fácil. Mas como foi visto aqui, no post sobre a Croácia e a Bósnia-Herzegóvina, o fim e a divisão da Iugoslávia, e também da União Soviética, incharam as eliminatórias europeias, e um sorteio abençoado pode transformar algumas seleções em grandes enganos. Tendo em seu grupo Dinamarca, República Tcheca, Bulgária, Armênia e Malta, a Itália nadou de braçada e terminou invicta, seis pontos à frente da segunda colocada. Não quer dizer nada, e a seleção italiana que vem para cá é a incógnita de sempre. Bem do jeito que eles preferem.

Já o grupo na primeira fase da Copa é osso. Tem Inglaterra e Uruguai, além da pobre-coitada da Costa Rica. E aí, além de ser uma lamentável aliteração, entra em cena o chato chavão do “deixou chegar”. Se a Itália for para as oitavas começa outra competição, em que a manha dos caras é difícil de ser batida. E mesmo que passem em segundo lugar, serão favoritos destacados contra qualquer um dos possíveis adversários (Colômbia, Grécia, Japão ou Costa do Marfim). A Itália pode ir longe. Não acredito que nos vençam num confronto direto, mas se por acaso cairmos antes, não me surpreenderia se eles atropelassem os queridinhos de sempre da mídia – Alemanha, Espanha, Holanda e Argentina.

Gosto do Balotelli. Buffon é um goleiro que se impõe. É realista e produtiva a ideia de usar o Juventus como base – o clube costuma ter seis ou sete jogadores convocados. Mas acho estranho o time ainda depender tanto do velho Pirlo para ter o mínimo de lucidez, e não consigo enxergar futebol de seleção no Thiago Motta. Entretanto, no caso dos italianos, nada disso vale muita coisa. Traiçoeiros, nem um pouco confiáveis, tanto podem ser despachados na primeira fase quanto chegar à final.

O negócio do futebol italiano é ser malandro regular, profissional, malandro com aparato de malandro oficial. Por isso, é bom adotar o refrão do samba-enredo que a Unidos de Vila Isabel cantou no Carnaval desse ano: tem que respeitar. 

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