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    Paulo Gonet e Flávio Dino: o ministro do STF agora tem, no procurador-geral, um aliado na campanha contra as emendas Pix Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

questões constitucionais

PGR pede ao Supremo para acabar com as emendas Pix

Ação movida pelo procurador-geral Paulo Gonet engrossa o coro de processos que contestam a farra na destinação de recursos por parlamentares

Breno Pires, de Brasília | 07 ago 2024_13h08
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A Procuradoria-Geral da República (PGR) moveu uma ação no Supremo Tribunal Federal pedindo o fim das transferências especiais, mais conhecidas como “emendas Pix” – uma modalidade de repasse pouco transparente e irrastreável feita por deputados federais e senadores. Essas transferências, criadas por uma emenda constitucional em 2019, permitem o envio de recursos federais diretamente para estados e municípios, sem a necessidade de convênios ou projetos específicos. A iniciativa do procurador-geral, Paulo Gonet, marca uma virada de posição na PGR, que durante a gestão de Augusto Aras (2019-2023) se omitiu do debate.

A PGR argumenta que as emendas Pix, além de comprometer a transparência e o controle da sociedade sobre o dinheiro público, violam princípios constitucionais e representam uma ameaça à ordem jurídica e à responsabilidade fiscal da União. A ação (ADI nº 7695) menciona um outro processo, a ADI nº 7688, movido no final de julho pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que também pede o fim desse tipo de emenda. Na última quinta-feira (1º), o ministro Flávio Dino concedeu uma liminar favorável à Abraji, estabelecendo regras de transparência e fiscalização para as emendas Pix. Gonet pediu que a ação da PGR tenha como relator Dino, que está à frente do processo movido pela Abraji.

A entrada da PGR na discussão respalda a liminar de Dino. O ministro do STF tem em Gonet um aliado em sua campanha para resolver o problema das emendas parlamentares, que se arrasta desde o fim de 2021. Naquele ano, o STF pela primeira vez tomou uma decisão para barrar o chamado orçamento secreto. Em 2022, o declarou inconstitucional, mas o Congresso desde então encontrou outras brechas para driblar a transparência no uso de dinheiro público.

As emendas Pix foram criadas por meio da Emenda Constitucional nº 105, que introduziu o artigo 166-A na Constituição Federal. Esse dispositivo permite, desde então, que emendas individuais de parlamentares destinem recursos a entes federados de forma direta, sem a necessidade de vinculação a projetos específicos e sem a formalidade de convênios. O objetivo, segundo seus defensores, era agilizar a execução de políticas públicas locais.

A simplicidade e a rapidez desse mecanismo, no entanto, implica falta de controle formal e de transparência sobre o destino do dinheiro. Inúmeras reportagens mostram que parlamentares destinaram emendas Pix sem justificativa para aliados, parentes e amigos. Há suspeita de que o dinheiro seja usado para alavancar campanhas eleitorais, irrigando pequenos municípios com quantias desproporcionais de recursos públicos.

A Abraji, na ação que moveu em julho, argumenta que as emendas Pix causam um “apagão fiscal” que enfraquece a fiscalização sobre o orçamento público, permitindo que grandes quantidades de dinheiro sejam transferidas sem prestação de contas. A falta de transparência, diz a associação, compromete a liberdade de imprensa (já que os jornalistas não têm acesso pleno aos dados das emendas) e o direito da população à informação.

A ação da PGR questiona a constitucionalidade das emendas Pix e reforça o pedido da Abraji para que sejam imediatamente suspensas. A procuradoria argumenta que esse tipo de emenda parlamentar desvirtua o planejamento orçamentário, compromete a responsabilidade fiscal e ameaça a separação entre os Poderes. Isso porque, segundo Gonet, ao permitir a transferência direta de recursos, sem que estes integrem formalmente a receita dos entes federados, as emendas Pix violam o regime federativo do Estado brasileiro e os princípios da publicidade, moralidade e eficiência administrativa. A PGR alega que o mecanismo abre brechas para o uso político e clientelista dos recursos da União, colocando em risco o equilíbrio orçamentário e a transparência na gestão pública.

As regras desobedecem aos limites materiais de reforma constitucional“, afirmou o procurador-geral. Segundo Gonet, a manutenção das emendas Pix pode acarretar consequências irreparáveis para a ordem jurídica e administrativa do país.

 

Embora a ação da Abraji já tramitasse no Supremo, a entrada da PGR dá um peso inédito à discussão. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade que protocolou no tribunal, o procurador-geral Paulo Gonet justifica o processo com base na “legitimidade ativa” — isto é, na autoridade legal — da procuradoria para tratar do assunto. A Abraji, segundo ele, não dispõe dessa legitimidade, porque seus “objetivos institucionais não têm relação de afinidade (pertinência temática) com o conteúdo das normas objeto de impugnação”.

O estatuto da Abraji, no entanto, diz que entre as prioridades da associação “estão a defesa da transparência nos negócios públicos e a garantia de livre acesso às informações dos órgãos públicos”. Além disso, o artigo 103 da Constituição garante a entidades de classe de âmbito nacional o direito de propor Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) no STF.

O movimento de Gonet se dá num momento em que deputados e senadores já discutem, nos bastidores, meios de recorrer da liminar concedida por Flávio Dino em favor da Abraji. A decisão do ministro ainda será submetida ao plenário do Supremo, que pode ou não referendá-la. A “ilegitimidade” da Abraji para participar do processo pode ser um dos pontos jurídicos abordados na discussão.

Se o STF acatar o pedido de suspensão cautelar das emendas Pix, agora respaldado pela Procuradoria-Geral da República, os repasses podem ser imediatamente paralisados. Caso isso aconteça, o Congresso terá de rever, finalmente, a forma como distribui recursos públicos.

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