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    Ilustração: Carvall

questões de mídia e política

Triunfos e fiascos na arena digital

Quem ganhou e quem perdeu espaço nas redes sociais em 2021 – e o que isso tem a ver com a eleição do ano que vem

Pedro Bruzzi e Leonardo Barchini | 30 dez 2021_10h04
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Oprincipal desafio, ao se analisar os dados de uma rede social, é saber que parâmetros utilizar. Os grandes números divulgados pelas próprias plataformas – qual foi o perfil mais engajado em 2021, qual foi a publicação de maior alcance – têm importância lateral. Determinados assuntos às vezes têm muita repercussão, mas logo somem, tornando-se irrelevantes em questão de horas. É a dinâmica das redes. Na análise que faremos a seguir, o que nos interessa é garimpar o que de fato importou para o debate público, sobretudo na cena política. Ao final, será possível arriscar alguns assuntos que terão relevância em 2022.

O ano de 2021 trouxe algumas mudanças para o debate nas redes. O Twitter continuou em ascensão e se consolidou como principal arena das discussões sobre política no Brasil. Política, nesse caso, tem sentido amplo. Não só a política eleitoral e partidária, comandada por políticos, é relevante nessa rede. Discussões sobre costumes, comportamento e até polêmicas em torno de programas de tevê têm sido cada vez mais relevantes. De maneira geral, aquilo que ganha tração no Twitter acaba se espalhando pelas outras redes, mesmo quando o Twitter não é a fonte primária de determinada postagem ou assunto. Exemplo disso é a quantidade de tuítes que viralizam em formato de imagem no Instagram.

Chama atenção, também, que o Twitter ganhou muitos usuários jovens, o que acabou impulsionando certos tipos de debate. O BBB, por exemplo, se mostrou um fenômeno de audiência não só na tevê, mas principalmente nas redes e entre esses jovens. A hashtag #BBB21 foi a mais replicada do ano, com mais de 100 milhões de menções (isso sem contar outras hashtags que faziam alusão ao programa). Abaixo do patamar do BBB, mas também com grande alcance, despontaram hashtags em referência ao programa concorrente A Fazenda, a times de futebol e a fenômenos musicais como o K-Pop. Política, apesar do que nossas bolhas fazem parecer, costuma ter um alcance relativamente restrito nas discussões em língua portuguesa no Twitter.

 

A pandemia teve uma relativa queda de interesse nas redes ao longo de 2021. Outros problemas, como a inflação – de alimentos e combustíveis, principalmente –, passaram a dominar a atenção dos usuários. Nem parece que foi este ano que a vacinação contra a Covid-19 teve início no Brasil. No dia 17 de janeiro, quando a primeira dose da vacina foi aplicada em São Paulo após meses de expectativa, houve um pico de publicações com os termos “vacina” (mais de 1 milhão de posts) e “João Doria” (mais de 360 mil posts).

Quando o BBB acabou, outro “programa” ocupou seu lugar: a CPI da Pandemia. A comissão parlamentar absorveu o interesse dos usuários assim que foi inaugurada, em abril. Apesar de ter encerrado os trabalhos com a audiência em baixa, a CPI foi muito comentada nas redes durante os primeiros meses. Cada depoimento de integrantes do governo gerava reações em tempo real no Twitter. Perfis não jornalísticos, como o @desmentindobozo, se empenhavam na verificação de informações e com isso apoiavam o trabalho dos senadores, relembrando declarações que punham os depoentes em situação delicada. Esses perfis trouxeram à tona um novo tipo de checagem de informações, mais ágil que a imprensa e as agências tradicionais. Em alguns casos, também mais eficaz, devido ao formato: afinal, quem poderia negar uma declaração em vídeo, disponível na internet?

 

Durante a CPI, o Brasil enfrentava um patamar alto de mortes por Covid-19, e o governo insistia – como faz até hoje – em sua postura negacionista, tanto em relação à gravidade da doença quanto em relação à urgência das vacinas. Conforme avançou a vacinação, assim como a investigação da CPI, a imagem do governo e do presidente Jair Bolsonaro sofreu um derretimento, perceptível nas pesquisas e no debate digital. Em 2020, apesar da condução desastrosa da pandemia, o governo ainda tinha alguma gordura para queimar, beneficiado pela repercussão positiva do auxílio emergencial. Esse crédito foi perdido em parte este ano, ainda que Bolsonaro se mantenha como um candidato competitivo.

De acordo com o Datafolha, 40% dos brasileiros desaprovavam o governo Bolsonaro em janeiro de 2021. Em dezembro, já eram 53%. O Ipec (antigo Ibope) mostrou um quadro semelhante: 39% desaprovavam o governo em fevereiro de 2021, número que aumentou para 55% em dezembro. Mais do que os desacertos do governo, a entrada de Lula no páreo contribuiu para que a população enxergasse uma alternativa a Bolsonaro. Nas redes, essa mudança se manifestou da mesma forma. A única diferença é que o presidente continua soberano no mundo online. Bolsonaro ainda é o político brasileiro com maior número de seguidores (e interações) em todas as redes. Seu reinado, contudo, também dá sinais de desgaste.

 

Como na política não há vácuo de poder, a queda da performance digital de Bolsonaro veio acompanhada da gradual, mas consistente, ascensão de Lula. O petista teve seu pico de menções no dia 8 de março, quando Fachin anulou as condenações da Lava Jato, restituindo, por tabela, os direitos políticos do ex-presidente. De lá pra cá, as menções se mantiveram em alta. Além de ser objeto de uma grande quantidade de publicações, em sua maioria positivas, Lula teve aumento considerável de seguidores: passou de 8 milhões no início do ano para 11 milhões agora (considerando todas as redes sociais). Mais precisamente, o petista angariou 2,9 milhões de seguidores. Bolsonaro, no mesmo período, ganhou adesão de 1,7 milhão de usuários.

 

No plano eleitoral, também saltou aos olhos a falta de espaço para a chamada “terceira via” nas redes sociais. A desastrada estratégia de Ciro Gomes já é conhecida e persiste até hoje: ao intensificar os ataques a Lula e ao PT, o pedetista acabou definhando nas redes. Na raia ao lado, João Doria, que vinha melhorando seus números devido a uma nova abordagem nas redes, também encalhou. Hoje é apenas um traço no debate digital. O tucano enfrenta altíssima rejeição, é ignorado pelos petistas e fustigado pelos bolsonaristas. Como se não bastasse, agora também tem sido espremido pelo que restou do agrupamento lavajatista nas redes, principal cluster – ainda que pequeno – avesso ao PT e a Bolsonaro. 

O cenário não é nada melhor para os órfãos da República de Curitiba. Ainda que tenha se lançado candidato com muito destaque na grande imprensa – que elogiou até suas sessões de fonoaudiologia –, o ex-juiz Sergio Moro não entusiasmou as redes. Seu desempenho digital tem sido discreto, refletindo o quadro das pesquisas de opinião. Vídeos confusos, conteúdo pasteurizado, propostas sem profundidade: seu perfil exibiu um combo completo que exalta mais seus defeitos do que qualidades. Moro parece se comunicar nas redes em uma espécie de juridiquês digital. Não à toa sua equipe busca novos marqueteiros.

 

O ano de 2022 deve começar, ao que tudo indica, como 2021. Novamente, Bolsonaro tem puxado a discussão sobre a vacinação. Seu agrupamento deixou de atacar diretamente a vacina, que se confirmou eficaz e teve grande apoio da população. Os bolsonaristas modularam o discurso e agora focam em uma suposta defesa da “liberdade” de escolher se vacinar ou não. Continuam disseminando informações falsas, neste momento direcionando suas baterias para o que consideram como risco na vacinação de crianças. É bem verdade que há um medo maior da população quanto à eficácia das vacinas em crianças. É natural. Mas o presidente, que amplifica esse discurso, fala com seu agrupamento mais fanático e isolado, mais uma vez. E, mais uma vez, atrapalha a necessária imunização da população.

O novo ano será atípico. Estamos às vésperas de mais uma edição do BBB, que novamente tomará as redes durante semanas. Quando o programa acabar (em meados de abril), o quadro eleitoral estará mais claro: as candidaturas terão sido definidas, políticos terão trocado de partidos, e o jogo eleitoral poderá começar de vez. Pela primeira vez desde 1994, a campanha não dividirá a atenção com a Copa do Mundo, que será realizada em novembro. Poderemos ter, assim, em termos de semanas, a maior campanha da história recente. Não há dúvidas de que, no mínimo, será um processo exaustivo para a população.

Até agora, Bolsonaro, ao que indicam suas mais recentes declarações, quer que o embate se dê em torno do antipetismo. Se a estratégia triunfar, há grande chance de crescimento do presidente nas pesquisas, impulsionado pelo agrupamento de liberais que hoje se diz desiludido com o capitão, mas não suportaria “a volta do PT”. Lula, por sua vez, quer relembrar os bons tempos do seu governo e avaliar a gestão Bolsonaro, em especial no que tange à economia. Nas redes, essa disputa pela “narrativa” da eleição já começou.

(Reportagem da Folha de S.Paulo teve 4,2 mil interações no Twitter) https://bit.ly/3ExFUUZ

Ainda que pareça óbvio, vale reforçar que as redes sociais não decidirão as eleições, mas serão um recurso eleitoral importante, assim como foram em 2018. Desta vez, os candidatos não serão tão surpreendidos como daquela vez. Todos vêm se preparando; alguns com mais acertos que outros. Entender como esse novo canal se soma aos recursos eleitorais tradicionais, como tempo de tevê, estrutura partidária e verba para campanha, é o desafio colocado. Que em 2022 a democracia se fortaleça o suficiente para aguentar os ataques que virão, seja no universo online ou no offline.

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