A Bola de Ouro é furada?
A Bola de Ouro da Fifa é um prêmio individual e, embora o foco desse post não mire as acusações de manipulação, votos erroneamente computados, etc. – coisas contra as quais, por se tratar da Fifa, já estamos vacinados –, acho que podemos discutir o critério.
No post publicado em 4 de dezembro, tratando do fantasminha uruguaio, escrevi que Diego Forlán ter sido eleito o melhor jogador da Copa de 2010 só não era piada maior do que Oliver Kahn ter recebido o prêmio na de 2002.
Há sempre um problema nessas premiações individuais do futebol. Toda vez que um goleiro é entrevistado por estar há não sei quanto tempo sem levar gol, ele faz questão de elogiar a zaga. Os zagueiros, por sua vez, rapidamente estendem as loas aos volantes. E se o assunto chega ao técnico, ele destaca a importância dos atacantes ajudarem na marcação. Há certa demagogia nessa excessiva exaltação do grupo, mas time de futebol funciona mesmo como um quebra-cabeça, um brinquedo de Lego.
Claro que destaques individuais podem ser identificados, e não é errado afirmar que Garrincha ganhou a Copa de 62, Maradona a de 86, Romário a de 94 e Zidane a de 98. Ninguém quer dizer com isso que esses caras jogaram pelos onze e se bastaram, mas sim que, se eles não estivessem em campo, dificilmente suas seleções teriam vencido. Falar que eles ganharam sozinhos é uma forma de enfatizar o decisivo desequilíbrio que cada um representou naqueles títulos.
E aí é que está o busílis do post: esses caras foram o fator de desequilíbrio na conquista do mais importante torneio de futebol que existe. Arrebentaram individualmente, mas, acima de tudo, foram campeões.
A Bola de Ouro da Fifa é um prêmio individual e, embora o foco desse post não mire as acusações de manipulação, votos erroneamente computados, etc. – coisas contra as quais, por se tratar da Fifa, já estamos vacinados –, acho que podemos discutir o critério.
Façamos de conta que não houve troca de votos e que eles foram registrados corretamente, que não aconteceu falha alguma e que o futebol é a máxima expressão do esporte na visão do Barão de Coubertin, sem qualquer outro interesse que não seja o enobrecimento do ser humano. Tá. Mas será que o jeito pelo qual passamos a avaliar os jogadores é o mais adequado?
Na última vez em que se cogitou a volta de Adriano ao Flamengo, muita gente defendeu uma remuneração à base de produtividade (com a qual concordo), outros sugeriram um salário menos indecente acompanhado de polpuda premiação por títulos (idem) e havia os que queriam um prêmio especial pela artilharia – e aí discordo totalmente.
Cristiano Ronaldo é extraordinário. Habilidoso, rápido, joga fácil pelos lados do campo e bate muito bem com as duas. Carregou nas costas a recente classificação de Portugal para a Copa e é, no mínimo, o melhor contra-atacante do mundo. Mas há um porém: Cristiano Ronaldo faz parte do Real Madrid, um dos times mais poderosos do planeta. Tão poderoso que: conseguiu tirá-lo de outra potência, o Manchester United; logo após a Copa de 2010, o Real levou dois dos jogadores que mais brilharam na ótima seleção alemã (Khedira e Ozil); fechou, no meio desse ano, a maior transação da história do futebol, comprando do Tottenham o galês Gareth Bale por 100 milhões de euros; tem no elenco jogadores das seleções da Alemanha, da Argentina, do Brasil, da Croácia, da Espanha, da França e de Portugal. E não é que, mesmo coadjuvado por craques dos melhores cantos futebolísticos, Cristiano Ronaldo não ganhou um mísero título nos últimos doze meses? (Evidentemente, aqueles troféus de pré-temporada, tipo Teresa Herrera, não podem ser considerados.)
Um dos problemas desse raciocínio é que, sempre que alguém o ensaia, é acusado de implicância com a marra e a personalidade narcísica do gajo. Como só posso falar por mim, garanto que no meu caso não há isso. Dispenso o narcisismo, mas sempre fui fã de jogadores marrentos e tento ver apenas o valor do que eles fazem em campo – o que, quando se trata de Cristiano Ronaldo, é indiscutível. Mas, repito: mesmo jogando no timaço do Real Madrid e tendo estraçalhado nas eliminatórias, Cristiano Ronaldo não ganhou nada em 2012/2013.
Ok, Murtinho. O Hernane ganhou mais título que o Cristiano Ronaldo. O Egídio foi campeão brasileiro. O Mario Gómez levou Champions League, Campeonato Alemão e Copa da Alemanha. E agora? Bom, agora a gente precisa ter bom senso, né? Mas se há quatro ou cinco caras jogando bola em altíssimo nível, a conquista ou não de títulos deveria ser um dos mais importantes critérios para a escolha do premiado. A não ser que um dos candidatos defenda o Betim ou o Macaé, o que jamais será o caso.
Temos a mania de dizer: ah, Fulano faz gol à beça. Sim. Mas será que, para que Fulano faça gol à beça, o time não está se expondo demais, não está jogando exclusivamente em função dele, não está desprezando as lições básicas de um esporte eminentemente coletivo?
Após a votação da Fifa, Platini se declarou decepcionado e, mesmo se descontarmos a patriotada em relação a Ribéry, o presidente da Uefa disse, para nos fazer pensar, que “o prêmio está se tornando um concurso que trata mais sobre popularidade do que sobre futebol”.
Jogador que faz gol é sempre muito popular. Jogador que ajuda o time a conquistar títulos, nem tanto.
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