Carioca ou catalão?
Domingo à tarde, no horário clássico do futebol, o jornalista e crítico de cinema Marcelo Janot facebookou o seguinte micropost: “Fluminense, Flamengo e Vasco fazem gols e o silêncio sepulcral que reina na vizinhança só é quebrado quando é gol do Barcelona. Pobre campeonato carioca.”
Domingo à tarde, no horário clássico do futebol, o jornalista e crítico de cinema Marcelo Janot facebookou o seguinte micropost: “Fluminense, Flamengo e Vasco fazem gols e o silêncio sepulcral que reina na vizinhança só é quebrado quando é gol do Barcelona. Pobre campeonato carioca.”
Aqui em São Paulo havia uma partida sendo disputada pelos dois melhores times do campeonato paulista, e acontecia a mesma coisa. Gol do Santos, som de grilos. Segundo gol do Santos, grilos. Gol do Palmeiras, grilos. Quando alguma jogada importante acontecia no Santiago Bernabéu, percebia-se um rumor no ar, aquele ohhhhhhhhhhh.
Do comentário de Marcelo Janot podemos descontar o fato de que, devido à nossa inacreditável habilidade para criar fórmulas esdrúxulas de campeonatos e da nossa colossal incompetência para montar tabelas, tanto no Rio quanto em São Paulo os jogos não tinham importância alguma. Mas desde quando Santos e Palmeiras se enfrentam na Vila Belmiro e isso não tem importância? Desde quando Fluminense, Flamengo e Vasco fazem gols e o domingo segue posto em sossego? E o pior: as pessoas não apenas optaram por assistir a um grande jogo de futebol, como talvez acontecesse se fosse Bayern de Munique x Paris St. Germain. O que entendemos do post de Marcelo Janot é que as pessoas estão se incomodando, tomando partido, torcendo pelo Barcelona. Rubro-negros, tricolores, vascaínos, santistas e palmeirenses deixaram de ver o jogo do seu time para torcer por um clube de outro continente.
Mais uma curiosidade é a escolha pelo Barcelona. Será por causa do Neymar? Será porque ninguém suporta a marra do Cristiano Ronaldo? Acho que não e desconfio que muito dessa preferência esteja ligada à questão da grana. Sou suspeito para falar, porque entre um e outro também torço sempre a favor do Barça e contra o Madrid, mas creio que as pessoas fazem uma identificação instantânea entre Real Madrid e o poder do dinheiro – que sempre incomoda. O Madrid é o clube que compra, compra, compra, gasta, gasta, gasta, e acha que o dinheiro resolve tudo. O Barcelona investe numa filosofia, aposta nos jogadores formados em suas divisões de base e faz contratações pontuais. No ótimo livro “Como o futebol explica o mundo”, o jornalista americano Franklin Foer reforça as teses da ligação entre o Real Madrid e o regime franquista, ao mesmo tempo em que escreve a seguinte frase sobre o Barcelona: “Os torcedores do Barça não desejam nada com tanto ardor quanto a vitória, com exceção do romance.” Não dá para deixar de torcer por um clube desses.
Claro que, agora em 2014, a paixão e o hábito voltarão a prevalecer quando começarem os jogos decisivos dos nossos pobres e desacreditados campeonatos estaduais. O problema está no médio prazo. Por mais habituado que esteja, por mais apaixonado que seja, chega uma hora em que o sujeito cansa de ver o Muralha em vez de ver o Modric, o Diguinho em vez do Di Maria, o Felipe Bastos em vez do Fàbregas.
A postagem de Marcelo Janot deveria servir de alerta para que dirigentes, TV Globo, PFC etc. abram bem os olhos, porque, para piorar o que dizia João Saldanha – “cuidado, vocês estão matando a galinha dos ovos de ouro” –, a galinha dos ovos de ouro está cada vez mais viva, só que cacarejando em outro lugar.
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