FOTO: MARCELO CAMARGO_AGÊNCIA BRASIL
Eduardo Cunha já renunciou antes sob acusações de corrupção
Deputado já havia feito o mesmo durante mandato de Anthony Garotinho no governo do Rio de Janeiro
Esta não é a primeira vez que Eduardo Cunha renuncia a um cargo público ao ser acusado de corrupção. Ele já havia feito o mesmo em 1999, mas pouco depois conseguiu voltar ao jogo político ainda mais forte. À época, no governo de Anthony Garotinho, Cunha presidia a Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro (Cehab) e passou a ser investigado pelo Tribunal de Contas por irregularidades em licitações. A maior delas envolvia a empreiteira Grande Piso, contratada por 34 milhões de reais para a construção de 3 425 casas populares do programa-vitrine de Garotinho, o Morar Feliz. Na ocasião, deputados estaduais receberam um dossiê que apontava fraude nos cartórios que registravam as casas entregues pelo programa.
A Assembléia Legislativa tentou, por duas vezes, abrir uma CPI para investigar a Cehab. Como já contei num outro post sobre Cunha, Garotinho me disse que sua relação com o ex-presidente da Câmara começou a degringolar quando ele presidia a Cehab. Disse que não o demitiu rapidamente porque o padrinho político de Cunha, o então deputado Francisco Silva, havia lhe pedido para manter o afilhado. “O Chico Silva me dizia: o Eduardo me ajudou muito, vai segurando as pontas aí.”
As CPIs nunca foram adiante, e a gestão de Garotinho se viu cada vez mais acuada pela imprensa, até porque outros membros do governo acabaram atingidos pela onda de denúncias. Coube a Francisco Silva, dono da rádio evangélica Melodia, onde Cunha lançou seu bordão “O povo merece respeito”, escrever e entregar a carta de renúncia do afilhado a Garotinho. Nela, o deputado afirmava que pretendia “evitar qualquer espécie de especulação maldosa, que diga que o irmão Eduardo Cunha está sendo protegido pelo fato de ser evangélico”. Naquela noite, Claudia Cruz, apresentadora do telejornal RJTV, na Globo, e mulher de Cunha, leu no final a notícia de demissão do marido.
O então presidente da Cehab foi rifado com o intuito de aliviar a pressão contra o governo, mas nunca perdeu sua influência. Garotinho deu um jeito de nomear um deputado estadual para a Secretaria da Baixada e, assim, abriu uma vaga do PPB na Assembleia. Quem assumiu foi o primeiro suplente: Eduardo Cunha – que, em 2002, deu seu grande salto. Elegeu-se deputado federal, mas não se esqueceu dos amigos da Assembleia: doou 15 mil reais para Albano Reis, o Papai Noel de Quintino, 10 mil reais para Fábio Silva, filho de Francisco Silva, e 7,5 mil reais para Domingos Brazão, acusado de envolvimento com milícias. Deixou, assim, uma bancada pessoal na Assembleia.
Em Brasília, migrou para o PMDB, levado por Anthony Garotinho, com quem romperia logo depois. Cunha nunca ocupou cargo de direção na legenda nem foi campeão de votos, mas conseguiu ascender a líder ao mostrar que sua influência ultrapassava as fronteiras do partido e do Rio de Janeiro. Desde que ele se tornou presidente da Câmara, em fevereiro de 2015, são correntes as histórias de parlamentares eleitos com dinheiro de doações que teriam sido intermediadas pelo deputado. Em troca, os agraciados garantiriam fidelidade ao peemedebista.
Todo-poderoso até a votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff, quando já era investigado pela Lava Jato, Cunha só perdeu o apoio de seus pares porque sua situação na Justiça está cada vez mais complicada. Ele é réu em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) por ter recebido propina do Petrolão e lavado dinheiro em contas secretas na Suíça. A Justiça não só congelou seus bens como os de sua mulher. Desde maio, o parlamentar também não podia pisar na Câmara, afastado da presidência pelo STF.
Ao renunciar, Cunha sai do foco: a imprensa estará, a partir de agora, atrás de quem será o novo presidente da Casa. Além disso, o peemedebista deixa de ser julgado pelo plenário do Supremo, que cuida dos chefes dos Poderes, e passa à Segunda Turma, formada por apenas cinco dos 11 ministros. Ali, os julgamentos nem sequer são televisionados.
O deputado tentará, com essa manobra, salvar seu mandato para não cair nas mãos do juiz Sérgio Moro. Como se diz em Brasília, “sem foro, é Moro”. Abatido como nunca, Cunha não pode, no entanto, ser considerado cachorro morto. Não se sabe até onde vão seus tentáculos. No ano passado, o Brasil de Fato cruzou o resultado de três votações da agenda de Eduardo Cunha e detectou que 214 deputados eram fiéis a ele. O site também foi atrás, na Justiça Eleitoral, de quem havia financiado esses deputados, e a JBS apareceu como maior doadora: 15 574 958 reais foram distribuídos entre eles.
Pode ser que o dinheiro tenha entrado nas contas de campanha desses parlamentares de forma aleatória, já que a maior parte das doações cai na conta dos diretórios nacionais dos partidos, que por sua vez repassam o dinheiro aos candidatos. Tal dúvida, porém, logo deverá se dissipar. A resposta pode estar nas apreensões e prisões realizadas na sexta-feira passada pela Lava Jato. A J&F, holding da qual a JBS faz parte, está sendo investigada por suposto pagamento de propina ao doleiro Lúcio Bolonha Funaro para receber recursos do fundo de investimento do FGTS. Como a piauí já contou, vem de longa data a relação entre Funaro e Eduardo Cunha.
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