LAGARTO (SE) – Há cerca de três dias, o Jornal Lagartense, diário desta municipalidade de Sergipe, vem sendo objeto de protestos incisivos dos meios jornalísticos nacionais e internacionais que o acusam de não empregar uma só vez o adjetivo ícone em sua extensa – e, de resto, correta – cobertura da morte de Oscar Niemeyer, ícone da arquitetura modernista. “É inadmissível”, esbravejou um repórter de O Globo, à sombra dos pilotis icônicos do Edifício Gustavo Capanema. O profissional, que não quis se identificar, lembrou que apenas ontem, na página 14 do jornal carioca, empregou o adjetivo duas vezes em menos de três parágrafos, “conseguindo, inclusive, aplicá-lo a outras personalidades brasileiras além do nosso mestre desaparecido.” Sublinhou também a dupla ocorrência de emblemático, primeiro na linha fina da matéria, depois no corpo do texto, “o que, convenhamos, é o mínimo que se espera de um jornal que presta homenagens a um dos criadores mais icônicos da história brasileira”.

Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo, Veja, Época e IstoÉ publicaram uma nota conjunta se solidarizando com os demais veículos de comunicação. Em passagem contundente, afirmam, em tom peremptório, que é impossível realizar jornalismo cultural original e de boa qualidade sem o uso recorrente do adjetivo desprezado pela publicação sergipana.

Em Brasília, o Palácio do Planalto se manteve em silêncio. Fontes ligadas à SECOM, no entanto, dizem que a omissão injetou novo ânimo nos proponentes da lei de regulação da imprensa. Um assessor ministerial que falou sob condição de anonimato, disse que o governo avalia ter ganho um argumento poderoso com o caso sergipano. “Se não houver algum tipo de controle, amanhã poderão escrever que a trajetória de Lula não é emblemática do avanço da sociedade brasileira, ou que o Chico Buarque não é um ícone da MPB.” Por mais que, por ora, este cenário não pareça ser plausível, uma hábil manipulação do episódio lagartense poderá convencer até mesmo a oposição da necessidade de criar normas que impeçam a deterioração do jornalismo.

No início da tarde, o Jornal Lagartense informou que o repórter responsável pela cobertura da morte de Niemeyer foi demitido. “Somos um ícone da ética jornalística”, disse Epaminondas Calvadinho, diretor de redação do diário, “e esperamos que nossa pronta reação ao episódio seja percebida como emblemática de nossos valores”.

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