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    FOTO DE NELSON JR./SCO/STF

questões jurídico-políticas

A última esperança petista sai de férias

Supremo mantém Lula preso; para advogados do ex-presidente, ministro Celso de Mello sinalizou para um lado e virou para o outro

Thais Bilenky | 25 jun 2019_21h42
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O advogado Cristiano Zanin Martins não parou de tremer os pés em mais de três horas de sessão. Cruzava e descruzava a perna esquerda sobre a direita. Sua mulher e sócia, Valeska Teixeira Martins, olhava fixamente os cinco ministros do Supremo Tribunal Federal reunidos na segunda turma na tarde de terça-feira, 25 de junho. O mais enigmático deles era o decano Celso de Mello, escondido atrás de uma pilha de livros e papéis. Segurava nas mãos a decisão que poderia soltar o ex-presidente Lula, cliente do casal, depois de 444 dias de cárcere.

Eram mais de sete horas da noite quando Celso de Mello começou a proferir seu voto. “Estou pessoalmente pronto para julgar o mérito desse habeas corpus. O meu voto foi concluído ontem à noite, na verdade, nesta madrugada. É um longo voto”, introduziu. Mas nunca chegou a lê-lo. A presidente da segunda turma, Cármen Lúcia, já havia indicado que os ministros só analisariam uma liminar apresentada pelo ministro Gilmar Mendes pela soltura de Lula até o julgamento do mérito do habeas corpus que pede a suspeição do juiz que o condenou, Sergio Moro. Caso o ex-magistrado, hoje ministro da Justiça do governo Bolsonaro, fosse considerado suspeito, a sentença proferida seria anulada, e o petista, solto.

Fiel a seu estilo, o ministro Celso de Mello anunciou: “Estaria de pleno acordo com a continuidade do julgamento, mas vejo que há razão da impossibilidade, portanto, ainda que reconhecendo o que acaba de dizer o ministro Ricardo Lewandowski, não tenho nada a opor ao adiamento deste julgamento, embora enfatize que estou inteiramente preparado para proferir o meu voto, que está aqui, completamente datilografado, digitado e pronto.”

O prólogo rocambolesco levou o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo a roer a unha do dedo médio da mão direita.  Celso de Mello continuava a falar.

“Que não se interprete o meu voto como sendo a antecipação de minha decisão futura quando do julgamento final do presente habeas corpus”, avisou. Celso de Mello passou então a citar o que sustentara ao declarar a suspeição de Moro em 2013 no caso  Banestado, ocasião em que foi voto vencido. O ministro argumentou pela anulação do processo que condenou o doleiro Rubens Catenacci por crime contra o sistema financeiro nacional, que causou prejuízo aos cofres públicos em meio bilhão de reais. Mello afirmou que Moro, naquele caso, fora parcial ao, entre outras medidas, acatar o monitoramento dos voos dos advogados de Catenacci para garantir a execução de ordem de prisão.

“Nós sabemos que há uma grande discussão em matéria processual penal no sentido de que o poder geral de cautela do juiz não pode ser utilizado nem invocado em favor do Estado, tendo em vista o princípio da estrita legalidade”, arrematou o decano.

Advogados de Lula e outros criminalistas que assistiam à sessão, como Fabio Tofic Simantob, ajeitaram-se nas cadeiras. Zanin esfregava uma mão na outra, entrelaçava os dedos, voltava a esfregar as mãos. Parecia que o ministro caminhava em direção à cela do ex-presidente para liberá-lo ainda que provisoriamente.

Até que Celso de Mello alterou a rota. “Quando se discute a questão da revelação de fatos e eventos por aquele portal The Intercept Brasil, pela própria inimputez daqueles fatos, em razão de seu conteúdo haver sido contestado pelo ex-juiz federal Moro, quanto à sua autenticidade, havendo ele afirmado correta ou incorretamente, não vem ao caso, que essa disclosure [divulgação] dos dados poderia ter sofrido edição ou até mesmo adulteração…” O ministro não terminou a frase, mas abria o caminho para sustentar que desta vez, diferentemente de 2013, as evidências de parcialidade de Moro precisariam ser melhor examinadas.

Sua voz ficou mais grave e ele concluiu o voto. “Me manifesto no sentido do indeferimento da concessão da medida cautelar [que soltaria Lula até segunda ordem], mas insistindo que esse meu pronunciamento não antecipa a decisão que eu já tenho preparada para examinar o mérito, o fundo da controvérsia”, decretou.

Cármen Lúcia rapidamente reiterou sua posição contra a liminar. Edson Fachin já o havia feito. Gilmar Mendes e Lewandowski já tinham dado o voto a favor da libertação do ex-presidente. Com o recesso do Supremo, a retomada do caso ficou para agosto. Quando julgar o mérito do HC – a suspeição de Moro –, tudo indica que Celso de Mello, mais uma vez, será o fiel da balança.

“Vou para Portugal e Siena, mas me arrependi”, contou Lewandowski a Cardozo, já terminada a sessão. “Esse negócio de tirar férias…”, brincou. Já caminhando em direção ao estacionamento, Tofic foi cumprimentar Valeska. Comentaram a ambiguidade do voto de Celso de Mello. “Ele deu seta para a esquerda e…”, afirmou a advogada. “Virou para a direita”, completou o colega. “Ou ficou parado, vamos ver”, esperançou-se a defensora de Lula. “O ministro Celso fez três vezes a ressalva de que sua posição não era definitiva”, pontuou Zanin. E entrou no carro.

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